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P2P e cultura digital livre

Kim Dotcom e seu site Mega não vão solucionar a pirataria

Kim Dotcom não chegou nem perto do limite de 140 caracteres de um tweet para dar seu recado: "Como acabar com a pirataria: 1 faça uma coisa legal 2 torne a compra fácil 3 lance-a no mesmo dia no mundo inteiro 4 preço justo 5 que funcione em qualquer aparelho".

Por Tatiana Mello Dias
Atualização:

O tweet, sem pontuação e em inglês, tinha 126 toques e foi retweetado mais de 12 mil vezes. Mais de duas mil pessoas marcaram a mensagem como favorita. O fundador do Megaupload recebeu respostas como "amém" e "bomba de verdade". Postou o tweet novamente, citando o perfil da associação que representa os estúdios de Hollywood. "Ei, vejam o meu conselho, é de graça", acrescentou.

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O milionário alemão radicado na Nova Zelândia deve lançar no sábado seu esperado serviço Mega, que promete ser uma ferramenta para hospedar arquivos (como era o Megaupload) com um novo modelo de negócio, livre dos problemas legais enfrentados pelo site fechado pelo FBI.

À primeira vista é difícil discordar dos cinco passos apontados por Dotcom. Alguns deles estão de acordo com o que mostraram estudos relacionados à pirataria (que eu já citei algumas vezes): é preciso garantir preço e disponibilidade. Mas isso é mesmo o suficiente?

O tweet levantou uma discussão acalorada no fórum Reddit. E, como é de costume, os redditors (os usuários do site) ajudaram a relativizar e até a desconstruir o argumento de Dotcom.

Primeiro: o que é exatamente "uma coisa legal"? Se alguém baixa um filme, há pelo menos o interesse em ver do que se trata. E isso não significa que a pessoa nunca vai pagar para assisti-lo de alguma forma. Muito dinheiro é gasto em entretenimento e não necessariamente em coisas de qualidade. Por meios piratas os usuários têm oportunidade de experimentar e conhecer mais coisas - sem pagar - e, depois, podem escolher se vão gastar dinheiro com aquilo ou não. Indo a um show, por exemplo.

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Para outro redditor, os conselhos até poderiam reduzir a pirataria, mas dificilmente acabariam com ela. Sempre haverá pessoas que querem conseguir as coisas de graça. A pirataria também tem outras motivações: os piratas acham que o download ajuda na divulgação de um artista ou encaram a prática ilegal como uma forma de protesto - contra as travas DRM, por exemplo - para penalizar a indústria.

"Preço justo" também é um argumento rebatido. Muitos redditors aproveitaram o espaço para contar sua própria trajetória: eles costumavam baixar arquivos ilegalmente porque não tinham dinheiro - ou cartão de crédito. Quando eles ficaram mais velhos, optaram por formas pagas e mais convenientes de conseguir o conteúdo. Um deles citou, por exemplo, que hoje assina o Pandora para ouvir músicas e usa o Steam para comprar games. "Posso ser minoria, mas certamente não estou sozinho", escreveu. "As crianças e estudantes que pirateiam hoje são os trabalhadores com salário para comprar as suas coletâneas em 2020", disse outro redditor.

Piratas são pessoas e não robôs - e cada um tem a sua realidade, seu contexto e seus motivos que o levam a optar pelo caminho ilegal. Não há uma única fórmula. É por isso que as regras de Kim Dotcom não vão salvar a indústria. (Aliás, será que o Mega vai apresentar algo que satisfaça aos cinco critérios?)

O site que anuncia o Mega estampa um enorme aviso: "no dia 19 de janeiro este botão vai salvar o mundo". Difícil. Bem difícil. O problema é muito mais complexo e não tem uma solução pronta a ponto de provocar uma revolução. Estou curiosa e ansiosa para ver o que vem pela frente. Já estou convencida de que o Mega pode ser um ótimo serviço capaz de reconfigurar o mercado digital de entretenimento, mas dificilmente ele vai causar o impacto alardeado pela propaganda pirotécnica.

"A guerra pela internet começou", "Hollywood controla a política" e "O governo está matando a inovação" são algumas das frases de efeito que Kim Dotcom usa para apresentar o que chama de "volta" depois de sua prisão cinematográfica. Mas ele é menos mártir e mais marketing.

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