Para que os brasileiros matem menos, não vote nos políticos financiados por armas

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Por Bruno Paes Manso
Atualização:
 Foto: Estadão

Uma pistola 380 havia sido comprada por uma família em São Paulo para garantir a segurança de sua casa. Foi roubada por assaltantes. O proprietário, é claro, não teve tempo de reagir e levaram sua arma. No ano de 2005, em uma reportagem para o Estadão, acompanhei o caminho que a pistola havia percorrido depois do assalto. Antes de ser apreendida pela polícia, foi usada para matar mais três pessoas em seis assaltos.

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Primeira conclusão: Mais armas em circulação produzem assaltos mais violentos e abastecem o crime.

O Estatuto do Desarmamento foi aprovado em 2003 e entrou em vigor no ano seguinte. Em São Paulo, leis mais duras que tornaram o porte de arma um crime inafiançável estiveram associadas a estratégias inteligentes da polícia. Desde o final dos anos 1990, para reduzir os homicídios, blitze da PM priorizaram o recolhimento de armas frias em lugares com maior número de assassinatos - os chamados hot spots. Essa medida ajudou a mudar o hábito de pessoas que saíam armadas nas ruas.

No auge dos assassinatos em São Paulo, cheguei a entrevistar homicidas confessos que me contaram que só andavam na rua com a camisa para fora da calça. Isso porque, mesmo quando eles não portavam armas, precisavam dar a impressão de que os equipamentos estavam na cinta. O ambiente era de alta tensão. Entreveros fatais e escolhas precipitadas provocavam homicídios banais, ciclos de vinganças e rixas que causavam dezenas de mortes.

Armas para defesa se tornavam instrumentos de ataque. Estudos como o do economista Daniel Cerqueira já têm mostrado que a política de recolhimento de armas frias esteve fortemente associada a drástica queda dos homicídios em São Paulo. O receio de ser pego com arma fria pela PM mudou o comportamento e diminuiu a violência dos conflitos.

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Segunda conclusão: menos armas nas ruas, menos assassinatos.

Os ganhos com a restrição ao porte e à circulação de armas são concretos, como demonstra a queda de mais de 80%dos homicídios na capital paulista desde os anos 2000. Não se trata mais de um debate abstrato. A população sabe disso. Pesquisa da ACT (Aliança contra o Tabagismo) realizada pelo Datafolha revela que a indústria que causa mais repulsa na população é a de armas. 92% não votariam em determinados candidatos se soubessem que esses recebem da indústria de armas, contra 87% de indústria de bebida e cigarro, por exemplo.

Só que ainda existe um lobby forte da indústria nacional de armas e munições que financia a eleição de deputados e senadores no Congresso. Eles apelam para o medo para vender a ilusão de que a arma pode deixar o proprietário mais seguro. A eficiência do lobby é medida pela grande quantidade de projetos que existe hoje no Congresso com o objetivo de flexibilizar o Estatuto do Desarmamento.

Segundo levantamentos do Instituto Sou da Paz no Tribunal Superior Eleitoral, em 2006, 17 deputados e senadores foram eleitos com a ajuda de R$ 1,3 milhão vindos do setor de armas de fogo. Quatro anos depois, o total de deputados e senadores eleitos quase dobrou, chegando a 32 congressistas que receberam R$ 1,5 milhão.

O financiamento continuou nestas eleições. Um levantamento prévio feito pelo Instituo Sou da Paz identificou que nas atuais eleições a indústria de armas e munição já contribuiu com R$ 445 mil. O candidato ao governo pelo PMDB, Paulo Skaf, que é apoiado pelo ex-governador Luiz Antônio Fleury Filho, é por enquanto o político que mais recebeu verbas do setor: R$ 100 mil. O grosso do dinheiro, no entanto, deve começar a aparecer somente depois das eleições.

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Entre os que foram financiados pelo setor, o deputado Guilherme Campos infringiu o regulamento da câmara por relatar projeto da indústria que o financia. Há projetos que legalizam o porte civil (hoje proibido), dispensam a renovação do registro de posse da arma (algo temerário, pois neste procedimento garante-se que as pessoas renovem os testes técnicos, psicológicos, atestados de antecedentes, etc), libera a compra de até nove armas por cidadão e até 5.400 munições (50 por arma /  mês), além de praticamente inviabilizar a realização da campanha de entrega voluntária de armas.

É por esses motivos que o eleitor deve buscar saber a relação de seu candidato com as empresas que o financiam. Retrocessos importantes podem estar em jogo. Abaixo, lista dos candidatos que este ano receberam dinheiro do setor de armas. Mais informações, no site do Instituto Sou da Paz.

 Foto: Estadão
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