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Inédito: defesa de coronel Ustra valoriza Comissão da Verdade para contestar ações da Justiça

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) julga nesta terça-feira, 14, o recurso do coronel da reserva Carlos Alberto Brilhante Ustra contra a sentença na qual foi reconhecido como responsável por torturas no período do regime militar. Nos documentos enviados àquela corte, o advogado de defesa, Paulo Alves Esteves, sustenta a tese de que a discussão dos fatos envolvendo Ustra não cabe à Justiça, mas sim à Comissão da Verdade.

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Por Roldão Arruda
Atualização:

É a primeira vez, desde a instalação da comissão, em maio, que ela é invocada na defesa de um agente do Estado acusado de violar direitos humanos.

O processo - cujo recurso será julgado hoje - tramita desde 2005. Trata-se de uma ação civil declaratória, na qual a família Teles pede à Justiça que reconheça a participação de Ustra em torturas praticadas na sede paulista do Destacamento de Operações e Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), unidade vinculada ao 2.º Exército. No período em que ele comandou aquela instituição, entre 1970 a 1974, foram registradas 40 mortes em suas dependências segundo a Comissão Justiça e Paz, da Arquidiocese de São Paulo, no levantamento feito para o estudo Brasil Nunca Mais. No mesmo período, outros 502 presos políticos enfrentaram sessões de tortura. Entre eles estavam Maria Amélia e Edson Teles, autores da ação contra o coronel.

 Foto: Estadão

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Em 2008, o juiz Gustavo Santini Teodoro, da 23.ª Vara Cível, acatou o pedido da família e reconheceu a responsabilidade civil do militar. No julgamento do recurso encaminhado ao Tribunal de Justiça, o relator é o desembargador Rui Cascalde.

A seguir, os argumentos do advogado do coronel da reserva.

O principal argumento em defesa do coronel Ustra é baseado na Lei da Anistia, de 1979, que beneficiou os dois lados. O senhor vai continuar insistindo nessa tese?

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Não é só isso. Para entender o que está em discussão é preciso lembrar que o Estado brasileiro criou três leis especiais para tratar desses assuntos e que, em direito, quando surge uma lei especial, ela revoga a ordinária.

Quais seriam as três leis?

A primeira respondeu à pergunta sobre o que fazer com as pessoas acusadas de terem praticado ilícitos. Trata-se da Lei da Anistia, de 1979, que respondeu assim: todos estão anistiados. A segunda,  a Lei 10.559, de 2002, tratou das reparações para os anistiados, assinalando que os recursos para isso devem sair do Tesouro Nacional. O Estado assumiu a responsabilidade pelo que ocorreu, com o seguinte raciocínio: se o atribiliário foi o agente público e eu sou responsável por ele, eu pago. Já foram gastos cerca de R$ 6 bilhões nesse processo. Não é pouco. A terceira lei é a de número 12.528, de 2011, que instituiu a Comissão Nacional da Verdade, com tarefa de apurar os fatos ocorridos no período, sem precisar ir a juízo. As três leis foram feitas com o objetivo de garantir a pacificação e o bem comum, as três buscam a equidade a estruturação estatal.

O senhor já tinha citado a Comissão da Verdade?

Ainda não. Decidi fazê-lo ao estudar melhor a sentença, procurando um valor de juízo e tendo em vista o objetivo dos legisladores ao criarem as leis especiais. O que o Estado desejava? Qual era a finalidade dessas leis? Como disse o Jarbas Passarinho, na época da Lei da Anistia, a principal finalidade era a pacificação do País com o fim do período de exceção. A lei que criou a comissão faz parte de um tripé.

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Isso quer dizer que a reivindicação da família Teles deve ser discutida na Comissão da Verdade?

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Sim. Não é uma posição contra quem pleiteia, não é contra ninguém. O que eu quero dizer é que o caminho correto não é esse. O Estado perdeu um tempo terrível na definição das leis especiais, que revogaram as anteriores no tratamento desta matéria. Tratou de resolver todos os possíveis problemas que poderiam decorrer com a revolução, promoveu a anistia de parte a parte, assumiu a responsabilidade pelas indenizações e criou a Comissão da Verdade. De lá para cá não houve nada que revogasse essas leis especiais.

Esse debate pode retornar ao Supremo Tribunal Federal?

Eu estou questionando o descumprimento da lei e também um princípio constitucional, da razoabilidade, segundo o qual se deve adotar a decisão mais razoável e possível de se cumprir. O debate desse princípio leva o recurso para o Supremo.

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