Primeira Classe

A morte dos hatches médios

Segmento foi o mais abalado pelo crescimento dos SUVs compactos, que são hoje o grande desejo do brasileiro

Rafaela Borges

04 de fev, 2017 · 8 minutos de leitura.

A morte dos hatches médios
Crédito: Segmento foi o mais abalado pelo crescimento dos SUVs compactos, que são hoje o grande desejo do brasileiro

Golf, Cruze e Focus são hoje os três carros do segmento que ainda têm alguma relevância (Foto: Daniel Teixeira/Estadão)

 

Um executivo com que conversei no fim do ano passado foi enfático ao cravar: dizem que foram os sedãs os que mais sofreram com o crescimento dos pequenos SUVs. Não foram. É só olhar os números para concluir: os hatches médios estão desaparecendo.

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(No Instagram: @primeiraclasse_estadao)

De fato, em 2016, o segmento de hatches médios teve 25.150 unidades vendidas. No de sedãs médios, foram 142.143 emplacamentos. Uma diferença gritante.

Mais que isso, os sedãs têm diversos representantes no mercado. Do líder absoluto Corolla a modelos de marcas de luxo, são pelo menos 15 representantes. E, além do Toyota, dez têm vendas representativas (3 mil unidades ou mais em 2016).


No caso dos hatches médios, são pouquíssimos representantes. Apenas três vendem de fato: o líder Focus, o vice-líder Golf e o Cruze Sport6. O antigo sucesso Hyundai i30 desapareceu (leia mais abaixo) e o Peugeot 308 respira por aparelhos.

O C4 deixou de ser oferecido; o Bravo, também. Nenhum dos dois será substituído. A Fiat vai investir no sucessor do Punto, compacto, e espera que algumas de suas versões ocupem o lugar do Bravo.

Não há perspectivas para esse segmento. Os lançamentos minguaram. A Ford é a única que terá novidades: a nova geração do Focus está prevista para ser produzida na Argentina e vendida no Brasil.


Difícil dizer o que veio primeiro: o desinteresse do cliente ou das montadoras. Da parte das fábricas, o foco agora é total no segmento de SUVs compactos, velho desejo do brasileiro – e agora realidade (tanto que já é, em vendas, a segunda maior categoria do Brasil).

Os preços também não ajudam. Antes, a diferença de preços entre hatches e sedãs médios costumava ser mais ampla. Os modelos de dois volumes, além disse, traziam versões com motor mais fraco, geralmente não disponíveis nos irmãos de traseira pronunciada.

Agora, não mais. No caso do Cruze, o sedã e o hatch Sport6 têm praticamente o mesmo preço. Na hora de escolher, ainda mais em tempos de crise, o mais óbvio é que o consumidor queira o três-volumes. O porta-malas maior – e, em alguns casos, o entre-eixos mais longo – fazem dos sedãs escolhas mais racionais.


A verdade é que os hatches sempre foram escolhas mais emocionais. Então, sem grande apelo de preço e em tempos de racionalidade impulsionada pela crise, os dois-volumes médios estão cada vez mais próximos de desaparecer. Na faixa de preço em que eles atuam, a escolha recai sempre entre um sedã ou um desejado “jipinho”.

 

HISTÓRICO


Houve tempo em que eles eram desejo de muitos brasileiros. No fim dos anos 90 e início dos 2000, quando houve uma onda de nacionalização de carros europeus, os hatches médios eram sonho de consumo. Todo mundo queria um Audi A3 feito no Paraná, ou um Volkswagen Golf.

Havia também o Astra, grande sucesso no mercado nacional e líder por anos e anos, mesmo após ficar defasado em relação à versão europeia.

E por falar nisso, quando mercado começou a cair, ainda nos primeiros anos da década passada,  o A3 deixou de ser produzido aqui e o Golf passou anos e anos sendo vendido com uma solução “caseira” – enquanto o europeu mudava de geração.


Mas o segmento continuou tendo ampla representatividade, embora menor que nos anos anteriores – principalmente quando comparados aos seus “irmãos” sedãs médios.

Em meados da década passada, pouco antes do início da recuperação da indústria, o Ford Focus começou a se destacar, ultrapassando nomes como Golf e Stilo e assumindo o segundo lugar – atrás apenas do imbatível Astra, que, até por já estar defasado, oferecia bom custo-benefício.

E aí a indústria começou a crescer, e crescer, e crescer, para atingir seu auge no início desta década. Importado da Coreia, o Hyundai i30 ganhou relevância, e chegou a liderar o segmento por algum tempo. O Focus mudou de geração, mantendo-se em dia com o vendido no resto do mundo.


O Golf demorou mais, mas acabou seguindo o exemplo do Ford. Vieram os modelos das marcas francesas – C4 e Peugeot 307, que depois seria substituído pelo 308. O Stilo foi sucedido pelo Bravo.

O segmento ficou moderno, rejuvenescido, em dia com o mundo, e voltou a ser sonho de muitos entusiastas do automóvel.

Mas, então, a indústria voltou a apresentar sinais de fadiga, antes da queda vertiginosa em que se encontra atualmente. Mais que isso, os utilitários-esportivos começaram a ganhar cada vez mais espaço.


O Ford EcoSport já era sonho de consumo, mas por quase uma década, foi filho único. Aí, veio o Renault Duster. E, em 2015, junto com o início da nova fase de vacas magras da indústria no Brasil, Honda HR-V e Jeep Renegade. No ano passado, foi a vez do Nissan Kicks. Agora, chega o Hyundai Creta, e o Renault Captur vem aí.

A enxurrada de lançamentos comprova: investir em pequenos SUVs, no Brasil, é a opção segura. Para as montadoras. E para o consumidor. E os hatches vão ficando sem espaço. Vivendo das glórias do passado. Bem próximos da morte.

 


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