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Bebida

Gardel e chimarrão? É com o papa

Por Dias Lopes

Gardel e chimarrão? É com o papaFoto:

Passados apenas quatro meses da sua eleição, o papa Francisco já mostrou ser muito diferente do antecessor, inclusive nos gostos pessoais. Bento XVI ouvia Bach, bebia ocasionalmente vinho doce e Fanta Laranja em quase todas as refeições. Francisco aprecia tangos de Carlos Gardel, toma vinho com regularidade e adora chimarrão – a infusão típica da América do Sul, popular na Argentina, Uruguai, Paraguai (onde é bebida fria e se chama de tereré), em zonas da Bolívia, nos Estados brasileiros do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e em partes do Mato Grosso do Sul e Mato Grosso.

Na visita que fez em março ao novo pontífice, em Roma, Cristina Kirchner, presidente da Argentina, presenteou o conterrâneo com os avios necessários ao preparo do chimarrão (mate, para eles). O primeiro foi a cuia, fruto seco, duro e oco de uma planta americana, transformado em “chávena” rústica, sem alça. Nela se despeja água quente (jamais fervendo) na erva-mate – as folhas secas e trituradas da Ilex paraguariensis, árvore nativa da América do Sul. O segundo apetrecho era uma bomba (canudo longo dotado de um filtro em uma das extremidades) de prata e ouro. Não por acaso, os organizadores de sua visita a Aparecida, no início da semana, lembraram do hábito. No quarto, no Seminário Bom Jesus, deixaram à disposição de Francisco os avios do chimarrão.

Papa Francisco visa Aparecida do Norte. FOTO: Márcio Fernandes/Estadão

O papa portenho aprecia o chá inventado pelos índios guaranis, de sabor amargo, que os colonizadores europeus encontraram aqui e assimilaram por intuição dietética: dilui gorduras e toxinas, tem ação estimulante e antioxidante, contém vitaminas, sais minerais, flavonoides, etc. No Rio Grande do Sul, cujos habitantes são predominantemente carnívoros, associa-se o consumo do chimarrão à longevidade. Segundo o IBGE, a expectativa de vida dos gaúchos chega hoje a 75 anos, enquanto a média nacional está em 72,7 anos. Mas o hábito do chimarrão, talvez pela rusticidade do preparo, nunca conseguiu ultrapassar a região de origem. Neste ano, por ser seu fã, Francisco lhe deu inesperada difusão mundial.

Os avios do chimarrão dos argentinos não são iguais aos dos brasileiros. Sem contar que eles preferem a erva-mate mais grossa, portanto, mais forte. As cuias vêm de plantas diferentes. Na Argentina (e no Uruguai) é pequena e achatada dos lados. Vem da Crescentia cujetai. Já a brasileira, também chamada de porongo, maior e ovalada, tendo muitas vezes a boca larga, deriva da Legenaria volgaris.

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Os argentinos adotaram sua cuia por economia, no século 19, quando o Paraguai, principal exportador do produto, proibiu o envio da erva-mate para fora do país. Tendo de se abastecer no Brasil, estimularam a cultura da Ilex paraguariensis em Santa Catarina e no Paraná. Mas a erva-mate encareceu, pois era comprada mais longe e chegava em carretas. O chimarrão brasileiro é mais saboroso que o argentino. Afinal, é feito com erva-mate mais fina e abundante na cuia.

As pessoas que conviveram com o papa Francisco em Buenos Aires lembram que o então cardeal Jorge Mario Bergoglio cumpria a liturgia comunitária da bebida. Quando estava acompanhado, tomava o primeiro chimarrão, esgotava completamente o líquido (sorve-se até fazer um “ronco”) e depois ia enchendo novamente a cuia com água quente, para servir a cada pessoa da roda.

>> Veja todas as notícias da edição do Paladar de 25/7/2013

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