Jô, você me pediu dicas de leitura para as férias.
Começaria com MARGARITA GARCIA ROBAYO, a colombiana GUAPA que mora na Argentina e escreveu um conto sobre suas relações com homens mais velhos para a revista Orsai, AMAR O PAI.
É ela na capa da revista.
A piauí desse mês publicou traduzido por Sérgio Molina e Rubia Goldoni.
Como escreve bem a chica...
Ela tem vários livros publicados, mas nenhum no Brasil.
Logo logo ela desembarca por aqui. Fala com uma crueza sobre sexo e amor, que foge dos parâmetros de literatura feminina que eu conhecia. Chega naquele ponto em que o leitor não sabe se ela está falando mesmo das suas experiências ou inventando.
O que na verdade pouco importa.
A mesma sensação que se tem quando se lê DIVÓRCIO, de RICARDO LÍSIAS.
O melhor e mais perturbador livro de autor brasileiro quem li nesse ano.
Você conhece a história?
Um escritor chamado Ricardo encontra o diário (sim, diário, em papel) da mulher e descobre que ela, uma jornalista cultural que se acha "a melhor jornalista cultural do Brasil" e escreve coisas como "A Notre Dame é um patrimônio histórico da humanidade", com quem se casou 4 meses antes, se casou com ele porque achava importante se casar com um escritor, apesar de descobrir que o marido parecia um "autista". Confessa no diário que teve um caso com um jurado do festival de Cannes, que ela cobriu para um grande jornal.
Ricardo xeroca o diário, sai de casa, informa que irá processá-la.
No começo do livro, ele diz que é tudo verdade. No final, que nem tudo é verdade.
É um jogo perturbador do uso da LITERATURA COMO VINGANÇA.
Acontece que LÍSIAS escreve muito, é irônico na medida certa, é ciente da experiência doentia e crime de injúria que comete, mas não resiste: movido pelo ódio de ter caído no conto de vigário do amor, e por ter sido traído ainda nos primeiros meses de casamento, deixa o impulso e os instintos misóginos conduzirem a sua vida.
E nos faz rir quando lista as gafes da mulher, que se acha o máximo,e diz coisas como "Notre Dame é um patrimônio histórico da humanidade".
O livro bombou. O cara já tinha recebido diversos prêmios. Vai longe.
Homem traído faz parte de uma corja, mesmo. Lembra-se de ANTONIO CONSELHEIRO?
Viu no que deu?
Imagine homem traído escritor. Coitada da fulana. Literatura é uma missão.
Mas, lembre-se: pode ser tudo mentira. Não é fascinante?
Jô, você me disse que está terminando AMOR SEM FIM e amando IAN McEWAN.
Bem-vindo ao time. Você fala com um dos obcecados pelo autor. É para mim o maior escritor vivo de língua inglesa. Perguntou qual livro dele deveria ler em seguida. Indicaria NA PRAIA, SOLAR e AMSTERDÃ.
Mas para tudo.
Você tem que ler REPARAÇÃO. Você sabe, virou filme, DESEJO E REPARAÇÃO.
Era o único que eu não tinha lido, exatamente porque já tinha visto o filme, até meu amigo MARÇAL AQUINO me dar uma dura e dizer: "Filme é filme, livro é livro. É o melhor livro dele!"
E é sim disparado. Então fica a dica.
Se você quiser ler um livro de crônicas, tem que ler DAVID FOSTER WALLACE, FICANDO LONGE DO FATO DE JÁ ESTAR MEIO QUE LONGE DE TUDO. É a minha [e de muitos] nova obsessão.
Dei de presente para amigos que postam no FACE me agradecendo.
Marca para sempre.
Você não fica mais o mesmo após lê-lo.
Em julho do ano que vem, a Cia. Das Letras publica seu romance, INFINITE JEST [tem uma versão de Portugal rodando pelas livrarias, mas eu esperaria a brasileira]. Você vai se assustar. Tem mais de 1.100 páginas. Ele não para no colo. Nem na praia, nem no avião. Teremos que ler apoiado numa mesa.
Tenho amigos quer leram. E me disserem que temos que ler.
O melhor amigo dele era JONATHAN FRANZEN.
Aí vão mais duas dicas, os romances AS CORREÇÕES e LIBERDADE, do Franzen.
Li na ordem inversa, mas acredito que não altera. Livros que você lê e volta a acreditar na linguagem do romance e em suas infinitas possibilidades.
E não se esqueça de outro que eu já tinha te indicado, A TRAMA DO CASAMENTO, do JEFFREY EUGENIDES.
Olha uma foto dos 3 juntos, quando eram garotões [Jonathan, David e Jeffrey]
Livro que foi injustamente malhado, apesar de não ter sido lido, pela crítica brasileira.
Na lista dos melhores livros que li nesse ano. Dica do Marquinhos, da Merça.
Filosofia na pureza de quem ainda não saiu da escola.
Acabou de ser publicado pela FOZ.
OK? Boas férias, querida. Na volta, me conta tudo.