Trata-se de um trabalho interessante, com sua mescla de realismo crítico social posto em diálogo com elementos do gênero fantástico. Na história, a dona de casa Helena (Helena Albergaria) decide montar um negócio próprio, um mercado, e aluga um imóvel para esse fim. No mesmo dia, seu marido, Otávio (Marat Descartes) chega em casa com a notícia de que foi despedido de seu emprego de gerente de uma grande corporação. É uma reversão de expectativas, banal na reciclagem programada de empregos na economia contemporânea. O que não parece tão normal é uma série de pequenos fatos que começam a perturbar a família.
Diga-se em favor de Trabalhar Cansa (título de um poema de Cesare Pavese) que os elementos de fantástico dispostos na trama são de natureza sutil. E, tão sutis, que levam o filme a uma tensão crescente. Por um lado porque acontecem coisas que não se compreendem; por outro, porque a parte da situação que se compreende - o desemprego do marido, o seu esmagamento pelas novas técnicas de gerenciamento de RH - são compreensíveis até demais.
No resultado dos dois processos, que se acionam mutuamente pela rigorosa carpintaria da direção, a sociedade contemporânea aparece com sua face terrível de monstro econômico que devora as pessoas. Como dizia Goya, o sono da razão produz monstros.