1) O tecnocrático. Ele desfila boas razões (técnicas, claro) para fundamentar a opinião. Neymar não teria mais adversários à altura. O jogador só progride quando encontra desafios crescentes. Esses desafios aqui seriam impossíveis pois, como se sabe, é na Europa que se concentram os talentos. Se ficar por aqui, o craque acabará por se repetir e não desenvolverá suas potencialidades como o faria se estivesse jogando em um dos gigantes do continente europeu. Há nomes respeitabilíssimos que defendem esse ponto de vista, entre eles Mano Menezes, até agora o técnico da seleção brasileira. Para eles, a saída de Neymar seria boa para o jogador e, sobretudo, para a seleção brasileira, que então teria um atleta já tarimbado pela excelência europeia na Copa de 2014.
2) O torcedor enrustido. Esse, para não dar muito na vista, saca do bolso argumentos racionais, como os expostos acima, mas não consegue disfarçar o ressentimento. No fundo sabem que jogadores fora de série desequilibram as disputas (sobretudo contra o seu time). Aspira ao nivelamento por baixo, à mediocridade geral que transformaria os campeonatos em emoção pura, "pelo equilíbrio" das equipes. Neymar destoa dessa pasmaceira travestida de competitividade. Assim como destoam Ganso, Lucas e poucos outros. O ideal seria que fossem todos para os quintos dos infernos, ao invés de ficarem perturbando por aqui com seu futebol de qualidade.
3) O eterno vira-latas. Sempre que alguma coisa começa a dar certo, ele ressurge, e com força redobrada. Ele tem um pressuposto: o Brasil é um país que não presta. Se algo positivo surge por aqui, deve ser logo desqualificado. Se isso não for possível, dada a sua qualidade inegável, deve-se recomendar que saia logo do País e vá brilhar em palco digno do seu talento. Se o tal cidadão fora de série for um cientista, por exemplo, recomenda que se mude para os Estados Unidos, país onde se faz pesquisa a sério. No caso do futebol, o destino é sempre a Europa. A expressão complexo de vira-latas, você sabe, foi inventada por Nelson Rodrigues para definir o aparentemente invencível sentimento de inferioridade do brasileiro. É pior ainda: esse personagem alimenta o desejo secreto de que nada dê certo, nada funcione ou prospere, para que assim possa exultar: "Viu? Eu tinha razão". Sentir que sua opinião é a correta parece ser uma das maiores paixões do ser humano. Ainda mais quando essa opinião se confirma como negativa. Vá entender... Mas a alma humana comporta esses desvãos.
Por sorte há também os que ficam muito contentes com a presença do talento entre nós. Acham positivo o desafio que representam e entendem que qualidade chama qualidade. O desafio de superar o melhor é que faz seus pares crescerem. Quanto mais craques houver, melhor o nível da competição e maior a probabilidade de que outros craques surjam.
* Coluna Boleiros, publicada no Caderno de Esportes do Estadão