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O andar do economista bêbado

Temporada de caça aos ursos

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Por Luciano Sobral
Atualização:

2013 não está terminando bem para os pessimistas com os mercados de ações dos Estados Unidos. O índice S&P 500 deve terminar o ano perto dos 1800 pontos, tendo subido cerca de 25% com relação ao nível do final de 2012. A expectativa média das projeções que 14 grandes instituições apresentaram há um ano a seus clientes era 1534 pontos, mais de 17% abaixo de onde o mercado se encontra. O mais otimista entre esses (usualmente exageradamente otimistas) analistas esperava alta de pouco mais de 12%. Os pessimistas foram atropelados, mesmo com um cenário econômico pior do que se imaginava: em dezembro do ano passado, o Fed acreditava que o PIB americano cresceria, em 2013, entre 2,3% e 3,0%. O crescimento efetivo dificilmente passará de 2,0%.

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Mesmo com a economia não ajudando, as empresas foram capazes de seguir crescendo lucros (na média do índice, algo como 5%) e a promessa de mais tempo de juros muito baixos seguiu atraindo compradores para as ações a múltiplos mais altos. Para Jeremy Grantham, sócio-fundador da gestora GMO, que administra US$ 112 bilhões em ativos, o Fed vem buscando deliberadamente estimular os mercados de ativos, com a justificativa que os ganhos da população com os investimentos ajudam a sustentar a economia (o chamado "efeito riqueza")*. Ele qualifica essa política como "um trato com o diabo": a GMO acredita que, no longo prazo, os preços dos ativos retornam à tendência que reflete seus fundamentos, e, quando isso ocorre, os ganhos com preços sobrevalorizados são varridos. A gestora projeta perdas anuais (descontadas da inflação) de 1.3% para investimentos em ações de grandes empresas americanas nos próximos sete anos. No caso das "small caps", a perda projetada é de 4,5% anuais, o que pode equivaler a um ano de 36% de queda, caso o ajuste seja acelerado.

No entanto, Grantham vê boas chances de que os estímulos do Fed continuem sustentando o mercado por bastante tempo. Ele aponta para a regularidade, desde 1932, de altos retornos para ações no terceiro ano do mandato presidencial. Considerando que os preços entrarão no segundo ano já sobrevalorizados, a probabilidade da criação de uma nova bolha deve ser considerada com atenção, diz Grantham.

George Soros disse que a primeira coisa que se deve fazer quando se enxerga uma bolha inflando é comprá-la - lição talvez aprendida a duras penas durante a bolha do Nasdaq, quando seu fundo, o Quantum, cansou de tentar ver alguma racionalidade no mercado e decidiu devolver dinheiro aos clientes. Hugh Hendry, outro grande gestor (da inglesa Eclectica) parece estar seguindo a recomendação de Soros. Na sua mais recente carta aos investidores, ele levanta a possibilidade de um "ciclo virtuoso" para preços de ativos, com a acumulação de capital na China sustentando uma pressão deflacionista global que serve como justificativa para que o Fed mantenha os juros muito baixos e as compras de títulos.

Tanto Grantham quanto Hendry acreditam em um papel preponderante do Fed na continuação de um ambiente favorável para os mercados. Os maiores riscos, portanto, estariam em um cenário que se afaste do que o Fed imagina: uma recuperação rápida do emprego nos EUA ou, por qualquer motivo, a inflação acelerando. O passado recente mostrou que crises bancárias não assustam mais, com os bancos centrais dispostos a gastar o que for preciso para salvar o sistema financeiro. A grande interrogação está na capacidade da economia e dos mercados se sustentarem quando o Fed quiser ou precisar levar os juros reais de volta a território positivo.

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* Participei de uma discussão com Grantham há poucos dias; as opiniões que replico aqui refletem o que ouvi e a leitura de suas cartas aos investidores.

 

 

Este artigo foi publicado originalmente na AE-News/Broadcast

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