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O andar do economista bêbado

O crescimento do PIB além do curto prazo

Por Luciano Sobral
Atualização:

Comentar cada leitura trimestral do PIB parece-me uma atividade mais estéril do que debater o desempenho do time preferido na rodada passada do campeonato. Enquanto os resultados de esportes são facilmente interpretáveis e raramente sujeitos a mudanças, o PIB é uma estimativa estatística complexa (pior: complexa vestida da simplicidade com que o crescimento é usualmente reportado) e longe de ser definitiva. Não necessariamente a última informação disponível é a melhor, revisões são frequentes e o número final nem sempre se parece com a estimativa divulgada na data marcada (claro que as revisões merecem muito menos destaque entre os comentaristas habituais).

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Feita a advertência, vamos aos fatos: creio que o grande destaque dado ao fraco crescimento do terceiro trimestre é simétrico à euforia que o governo tentou vender após a pseudo-retomada do período anterior. Na realidade, nem a economia está decolando, nem afundando: teremos um ano de crescimento medíocre, próximo a 2,5%. Não por coincidência, esse número é bastante próximo ao crescimento médio dos últimos cinco anos, e, arriscaria dizer, do potencial do país. Enganou-se quem acreditou que o crescimento dos anos Lula, próximo a 4% anuais, iniciava um novo padrão: confundia-se a bonança de commodities com mudanças estruturais. O passar do tempo sugere que, na verdade, pouca coisa mudou nesse campo: sem a sorte de ter os preços do que vendemos ao exterior se multiplicando, somos um país que cresce a 2%-2,5% anuais (média dos anos FHC - surpresa! 2,3%).

Se devemos lamentar que não houve avanço estrutural no nível do crescimento, podemos comemorar que, nos últimos 20 anos, ele se tornou menos volátil: desde 1993, período em que aconteceram algumas grandes crises no mundo emergente (México, Sudeste Asiático, Rússia, Argentina), duas grandes desvalorizações do real e "a" grande crise do capitalismo internacional em muitas décadas, o Brasil teve apenas um ano de retração do PIB real (2009). É difícil mudar a velocidade ou o rumo do barco, mas também tem sido difícil naufragá-lo.

Há, porém, muitos bons economistas que apostam em um grande ajuste após a definição das eleições presidenciais de 2014, que potencialmente invalidaria a análise acima. Ainda que, de fato, algumas distorções precisam ser corrigidas com alguma urgência (na minha visão, sobretudo a concessão de crédito nos bancos estatais e o preço dos combustíveis), duas das variáveis mais importantes da economia estão sendo ajustadas sem grandes disrupções: os juros estão de volta a um patamar compatível com o crescimento do PIB nominal (a regra de bolso favorita de Bill Gross, da PIMCO) e o câmbio reflete a piora na balança comercial e um choque de realidade na percepção dos investidores estrangeiros. Se são verdadeiros os sinais de que a tolerância com a pirotecnia promovida pelo Secretário do Tesouro está acabando, mais uma fonte de preocupação frequentemente citada pelo mercado pode ser diluída no tempo.

A frustração com o Brasil nos últimos anos deve-se menos ao desempenho da economia do que a um realinhamento de expectativas, e quanto a isso a equipe econômica deve apontar o primeiro dedo para si própria. Na primeira reunião ministerial do governo Dilma, em janeiro de 2011, Guido Mantega apresentou uma meta de crescimento médio anual de 5,9% durante os quatro anos do mandato, com a inflação voltando a 4,5% ao ano em 2012. Por esses e outros frequentes furos, a perda de credibilidade do governo não pode ser atribuída ao acaso ou à "má vontade" dos investidores. A torcida para 2014 e 2015 é que a conciliação com a realidade continue e que sejam evitados os delírios de grandeza e os supostos atalhos heterodoxos na, tão bem definida por William Easterly, "elusiva busca por crescimento".

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Este artigo foi publicado originalmente na AE-News/Broadcast

 

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