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Vácuo jurídico permite 'guerra eleitoral' sem controle nas redes sociais

Falha na lei pode permitir que adversários se ataquem sem grandes riscos de serem punidos

Por Agências
Atualização:

SÃO PAULO – A participação dos prováveis candidatos nas eleições deste ano nas redes sociais já está a todo o vapor e a tendência é que as campanhas eleitorais ocupem prioritariamente o Facebook e o Twitter. Essa preferência estaria relacionada não só ao fato de as redes terem se transformado em uma imensa vitrine com forte poder difusor, mas também e especialmente porque nesse campo a lei é falha. Segundo especialistas consultados pelo Broadcast Político, esse vácuo jurídico poderá ser útil inclusive para que adversários se ataquem sem grandes riscos de serem punidos

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Apesar de já existir regulamentação para a propaganda eleitoral na internet, que só é permitida de acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a partir do dia 6 de julho, ainda não há normas definidas para as mídias sociais. Só em março é que o TSE vai publicar as resoluções que valerão para o pleito deste ano, que podem ou não incluir a regulamentação das redes sociais.

A tendência, de acordo com o advogado Alberto Rollo, presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB de São Paulo, é que a Justiça Eleitoral libere o uso das redes sociais por parte dos candidatos. “O argumento é que para ‘ser impregnado’ pela propaganda eleitoral, o usuário tem que praticar atos voluntários de acesso”, diz, explicando que a exposição do eleitor à campanha dependeria de uma decisão dele mesmo, de entrar no canal.

No final do ano passado, por maioria de votos, o TSE decidiu que manifestações políticas feitas por meio do Twitter não são passíveis de ser denunciadas como propaganda eleitoral antecipada. Na ocasião, o ministro Dias Toffoli, relator de um recurso apresentado pelo deputado federal Rogério Marinho (PSDB-RN) contra multa aplicada pela Justiça Eleitoral do Rio Grande Norte, afirmou que há razão para “falar em propaganda eleitoral realizada por meio de Twitter, uma vez que essa rede social não leva ao conhecimento geral e indeterminado as manifestações nela divulgadas”.

O presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB de Pernambuco, advogado Walber de Moura Agra, lembra que nas eleições presidenciais de 2010 o então candidato José Serra (PSDB) conseguiu de forma inédita um direito de resposta no Twitter do Rui Falcão, hoje presidente do PT, que na época coordenava a campanha da presidente Dilma Rousseff. “Agora, com a mudança de posicionamento do TSE, praticamente está liberada a propaganda no Twitter”, avalia. “Seguindo esse direcionamento, o mesmo raciocínio deve ser transferido para o Facebook.”

Para o advogado e professor de direito eleitoral na PUC-SP, Carlos Gonçalves Jr., a relevância das redes sociais está bem maior neste ano do que em eleições anteriores e por conta disso a Justiça eleitoral deve formular normas a respeito do tema. “Espero que o Tribunal Eleitoral vá além e estabeleça mais parâmetros em relação a esta questão do que fez em 2012, quando foi muito tímido”, afirmou.

Segundo ele, no entanto, uma atuação mais enfática do TSE não deverá significar proibições ou censura. “Acho difícil que se estabeleça um controle prévio nas redes sociais, mas é possível existir a responsabilização”, afirma. Para o professor, as redes sociais fazem parte de uma manifestação da sociedade e dentro de um ambiente democrático “é desejável que população se manifeste”.

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Punições

Apesar da aparente ‘terra sem lei’, segundo os juristas, a Justiça Eleitoral tem instrumentos para responsabilizar e punir os infratores e administradores da rede. Os prováveis candidatos que fazem uso das redes sociais atualmente podem sim ser punidos caso façam propaganda explícita ou peçam voto abertamente. “Eles podem dizer o que estão fazendo, o que estão inaugurando, mas não podem nem dizer que são candidatos, muito menos pedir votos”, explica Rollo.

Segundo Moura Agra, há uma zona “muito lacunosa” entre o que é propaganda e o que é direito de resposta e livre expressão de pensamento. Além do comportamento de candidatos e partidos nas redes, há ainda brechas para a existência de figuras anônimas ou falsas que se utilizam do espaço para defender ou atacar determinado candidato.

“Ainda não há jurisprudência para perfis falsos nas redes sociais”, pondera Gonçalves Jr. “A Justiça deve estabelecer mecanismos para coibir esse tipo de prática”, diz, ressaltando que o a credibilidade de uma informação nas redes sociais “depende da confiança do interlocutor”.

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De acordo com Agra, a Constituição veda qualquer tipo de anonimato e essas páginas devem, primeiro, ser individualizadas. “Se cometerem indícios de ilegalidade, a divulgação deve ser retirada do ar. E se houver dano, a Constituição garante direito de resposta.”

Agra acredita que o TSE vai entender que vale tudo no Twitter e Facebook, porém, nos outros meios, como blogs e sites, que é aberta e acessível para todos, devem valer as mesmas regras regulamentadas para a campanha eleitoral em outras mídias. “Não há direito de resposta fora do período eleitoral”, lembra. “Mas há várias decisões judiciais (apesar de não haver previsão legislativa) que garantem”, pondera, citando jurisprudência no caso. “A Justiça vai em cima do provedor exigindo que tire a página do ar, sujeito a multa diária, por exemplo”, explica Rollo.

Dilma Bolada

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Sucesso entre os internautas, a página da Dilma Bolada, personagem de humor que exalta da figura da presidente, é citada por Rollo com um dos exemplos que pode gerar processos e até pedidos de retirada do ar. “A Dilma Bolada beneficia a presidente e ridiculariza os adversários. Não só pode como deve ser retirado do ar”, opina.

O professor Gonçalves Jr. discorda e acredita que a Justiça ainda não tem quantidade suficiente de decisões para uma visão conclusiva no caso específico da Dilma Bolada. “O humor é uma forma de manifestação social. Qualquer intervenção da Justiça eleitoral no caso da Dilma Bolada seria inconstitucional por violar o princípio da liberdade de expressão”, afirmou. “Não acho que ela (a Justiça)deva interceder.”

Agra lembra que na eleição passada o TSE permitiu a sátira de programas humorísticos com candidatos. “Humor pode. Não pode permitir ridicularizações e ataques contra a honra e moral dos candidatos”, explicou. Segundo ele, esses casos são passíveis de multa, direito de resposta e até condenação penal.

/Carla Araújo e Beatriz Bulla

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