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Quem é o dono do seu celular?

Operadoras restringem o acesso a aplicativos no celular. Para entidades de defesa do consumidor, prática é abusiva

Por Tatiana Mello Dias
Atualização:

Quando você compra um celular, precisa usar também, necessariamente, os serviços de uma operadora. Mas a operadora de telefonia pode regular a maneira como você usa o aparelho? A resposta correta é não. Mas, na prática, o que acontece é diferente.

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Ao comprar um aparelho do modelo Motorola Defy ou Galaxy S pela Claro, o consumidor não leva para casa o celular anunciado pelo fabricante, apresentado em feiras e testado por veículos que cobrem tecnologia e sim uma versão modificada pela operadora – nesse caso, para pior.

O aplicativo do Gtalk, o serviço de troca de mensagens instantâneas do Google, é ocultado do Android Market e a ferramenta de buscas padrão é a do Yahoo, embora o sistema operacional seja do próprio Google. Modificável. O Android é uma plataforma aberta, que pode ser modificada por fabricantes e operadoras. É isso que impulsiona seu crescimento e a sua adoção por aparelhos diferentes. Mas é isso, também, que permite a descaracterização do sistema operacional. E o motivo da restrição é comercial. “O que há é uma estratégia de preconfiguração de aparelhos vendidos com alto subsídio que visa a valorização dos produtos e serviços ou parcerias estratégicas que tragam valor para a operadora e seus clientes”, explica a Claro por meio de sua assessoria.

Só que, mesmo se o cliente pagar o preço total do aparelho – sem subsídios – ele não compra o aparelho em seu estado puro. “Todos os aparelhos comercializados pela Claro, com ou sem subsídios, seguem a mesma linha de preconfiguração da operadora e de seus parceiros.”

A empresa diz que permite aos clientes acesso irrestrito ao Market do Android, mas no caso dos aparelhos vendidos por ela, instalar o Gtalk é quase impossível – o aplicativo não aparece no Market, e trocar a busca do Yahoo para o Google, o padrão do Android, não é simples. Um usuário comum precisa, no mínimo, recorrer a um tutorial em uma comunidade sobre Android.

Para o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), a prática é abusiva. “Qualquer tipo de customização do aparelho entra como um risco de negócio que a empresa assume. E o risco nunca pode ser repassado para o consumidor”, explica o advogado Guilherme Varella. “Quando você adquire um produto ou serviço legitimamente, você tem o direito de escolher a forma como vai utilizá-lo, desde que dentro da lei.” E, no caso da Claro, o que acontece pode ser classificado até como venda casada, prática que é proibida.

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Não só a Claro restringe o que os usuários podem usar. Recentemente a Vivo bloqueou o aplicativo para iPhone Consumo, que controlava os dados utilizados pelos usuários. Criado pelo brasileiro Felipe Kellerman, o Consumo foi o primeiro app opensource desenvolvido aqui e fez tanto sucesso que derrubou os servidores da Vivo. Foi banido.

Clique para ampliar o infográfico: Foto: Estadão

“A primeira versão tinha um servidor intermediário que poderia oferecer riscos à segurança do nosso cliente, pois armazenava os dados de forma desconhecida e sem a comprovação das medidas de segurança necessárias”, justificou a operadora. Kellerman atualizou o aplicativo, que acabou sendo liberado. A questão apareceu há alguns anos, quando começaram a surgir os primeiros aparelhos com acesso a internet via 3G – e, com eles, a restrição das operadoras a aplicativos de voz sobre IP, como o Skype. “Se eu contratei um plano que me permite usar aplicativos, se eu não fizer nada contra a lei não há nada que me proíba de utilizá-los. Se a empresa coloca uma restrição tecnológica, é uma prática abusiva”, diz Varella. A Tim disse que não há qualquer restrição aos aplicativos da App Store e Android Market. A Oi não se manifestou.

O ponto chave dessa questão é: as empresas podem restringir a maneira como as pessoas usam a rede?

“Neutralidade é fundamental. A internet é uma rede ponto a ponto e a neutralidade funciona para que velocidade e qualidade sejam isonômicas, porque senão os pontos terão pesos diferentes e o fluxo das informações vai ser discriminado”, diz Varella. “A neutralidade impede a discriminação de produtos e serviços, que aplicativos sejam barrados e o privilégio de tráfego”, explica.

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Sem regulamentação. O princípio é citado pela Lei Geral de Telecomunicações, mas ainda há um vazio regulatório – por isso as empresas ficam livres para práticas consideradas abusivas pelas entidades. O que regularia isso, diz o Idec, seria o Marco Civil da Internet, legislação que definirá princípios básicos da internet no País, mas que ainda está sendo discutida no governo.

Enquanto as regras continuam turvas, o consumidor que se sentir lesado deve fazer uma reclamação formal à operadora para que haja o desbloqueio do aplicativo restrito. E, se nada acontecer, a recomendação é que se recorra ao Procon.

—-Leia mais:Link no papel – 04/04/2011

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