OAB se une ao combate a crimes de ódio e abuso na internet

Só no ano passado foram registradas quase 190 mil denúncias no Brasil; empresas, organizações e governos buscam formas de reprimir essas práticas

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Por Redação Link
Atualização:

CARLINHOS MULLER/ARTE ESTADÃO

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Rafaela MalveziEspecial para o Estado 

A Ordem dos Advogados do Brasil anunciou a criação de um grupo de trabalho que irá monitorar crimes de ódio na internet. O objetivo também é discutir maneiras de aprimorar as investigações e assegurar que quem veicule discurso de ódio seja, de fato, responsabilizado. Os integrantes do grupo e a forma de atuação em relação ao monitoramento desses crimes virtuais, bem como a identificação dos autores de conteúdo ofensivo na internet, ainda serão definidos.

A ideia de criar a equipe surgiu a partir de uma audiência na sede da OAB em Brasília com as jornalistas Cristiane Damacena e Raíssa Gomes, que sofreram ofensas racistas no Facebook. Porém esses não são casos isolados. Segundo dados da Safernet, organização de defesa de direitos humanos na rede, só ano passado foram registradas 189,2 mil denúncias no Brasil relacionadas a crimes e abusos online.

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Para Rodrigo Nejm, psicólogo e diretor da área de atuação e educação da Safernet, o problema não está na internet em si, mas no uso que se faz dela. Muitas vezes falta a consciência de que boa parte dos espaços na web são ambientes de interação social abertos, que têm grande visibilidade. Isso implica que os usuários devem assumir responsabilidade pública sobre o que se faz e o que se fala.

Liberdade de expressão

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Se por um lado a mediação tecnológica é positiva do ponto de vista democrático, uma vez que permite que todos tenham a possibilidade de se expressar, por outro lado ela funciona como um escudo. Segundo Rodrigo, só o fato de não haver o face a face deixa as pessoas mais à vontade para assumir uma postura radical. “Você não tem o resultado imediato daquele discurso ou violência praticada. A sensação é de que há proteção contra as consequências”, completa.

O maior desafio para coibir as condutas discriminatórias, de acordo com a pesquisadora do projeto Gênero e Tecnologia no InternetLab, Natália Neris, é realizar diagnósticos, investigações e punições à agressores sem que isso afete a liberdade de expressão e a pluralidade de discursos que não caiam nessa categoria. “O discurso de ódio na internet precisa ser encarado como uma violação de Direitos Humanos, mas também como uma ameaça à construção de uma esfera pública virtual democrática, plural”, diz.

Segundo a pesquisadora, a presença de violência no ambiente virtual pode inibir a participação da sociedade como um todo. “A violência pode afastar indivíduos, fazer com que estes temam por expressar suas opiniões e pontos de vista, e, no limite, pode calar suas vozes”, afirma. “Vozes estas muitas vezes subalternizadas e subrepresentadas em muitos outros espaços sociais – como é o caso das mulheres, negros, indígenas, LGBTs e pessoas com deficiência.”

Governo

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Com o objetivo de reprimir essas práticas criminosas, empresas, organizações da sociedade civil e governos de vários países buscam desenvolver meios para estimular medidas de combate e também de prevenção por meio da educação.

Após os ataques terroristas à redação do jornal semanal Charlie Hebdo e a um supermercado judeu, o governo francês, por exemplo, lançou em abril deste ano uma campanha para conter os crescentes crimes de ódio.

Entre algumas das medidas adotadas estão a imputação de penas mais graves para este tipo de delito, o monitoramento online, e treinamento reforçado sobre o assunto para professores.

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No Brasil, além de contar com órgãos como o Ministério Público Federal, que recebe denúncias pelo Atendimento ao Cidadão, há, desde 2008, uma parceria entre a Secretária de Direitos Humanos com a Polícia Federal e a Safernet para receber e mapear essas queixas.

Para dar mais visibilidade ao tema, o Governo Federal também lançou também em abril o programa Humaniza Redes, que envolve a publicação do Pacto Nacional de Enfrentamento às Violações de Direitos Humanos na internet, que, além de apoiar medidas de segurança e prevenção, tem por foco as denúncias de violação online de direitos humanos.

“O grande objetivo do Humaniza Redes é conscientizar que o crime na vida real é crime na vida virtual. O racismo é igual. Nessa semana, houve a primeira condenação de racismo ocorrido nas redes sociais. É esse tipo de debate que precisamos”, explica Irina Bacci, coordenadora da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos.

O Pacto também prevê orientações para professores, pais e alunos sobre criar um ambiente digital seguro e prevenir crimes digitais. De acordo com Irina Bacci, a liberdade de expressão é ainda muito mal interpretada e o passo mais importante no combate a esses crimes é a educação. “Dizer que não concordo com algo não é o mesmo que discriminar ou agredir alguém”, afirma.

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