O Efeito Facebook

David Kirkpatrick fala de seu livro sobre o Facebook, da amizade com Mark Zuckerberg e de privacidade online

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Por Carla Peralva
Atualização:

Leia a íntegra da entrevista com David Kirkpatrick, editor de internet e tecnologia da revista Fortune que passou dois anos pesquisando sobre o Facebook para escrever The Facebook Effect. Ele acredita que o Facebook passará o Orkut em número de usuários no Brasil em poucos anos e gostaria que seu livro fosse publicado por aqui, mas, por enquanto, só há data marcada para o lançamento no exterior.

Foto: Carolyn Jones Foto:

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Por que você decidiu escrever o livro? Decidi escrever o livro sobre o Facebook porque acredito que ele será uma das empresas mais importantes do mundo certamente uma das mais importantes da internet — e porque eu não acho que as pessoas o compreenderam muito bem. Achei que era uma boa oportunidade para explicar o Facebook para o mundo. E também porque eu tenho um acesso único à rede social devido à minha relação com Mark Zuckerberg.

Como é sua relação com ele? Eu o tenho como um amigo, o que não me impede de criticá-lo profissionalmente quando ele comete erros. Ele me respeita como jornalista e eu o respeito como empresário. A visão e o foco que ele tem de um empresa tão grande me impressiona. Eu também sempre me interessei pelo fato de que ele está mais preocupado em construir alguma coisa do que ter lucros a curto prazo. Ele acha que sou um dos poucos jornalistas que realmente entende o que ele está fazendo e isso é bom para mim, porque significa que ele vai falar comigo.

Como você conviveu bastante com ele, você deve poder nos explicar qual é realmente a concepção dele sobre privacidade. Ele deixou isso bem claro na coletiva de imprensa da quarta-feira (26, sobre o anúncio da simplificação dos controles de privacidade). Pessoalmente, eu nem gosto da palavra privacidade, porque eu acho que ela tem muitos significados diferentes para muitas pessoas. A pergunta número um, em minha opinião, é: o Facebook dá aos usuários controle suficiente sobre suas informações pessoais? Isso não é exatamente um problema de privacidade, é uma questão de controle. Em segundo lugar: é verdade que o mundo está indo em direção a uma mentalidade que se preocupa menos em proteger dados ou em que cada um de nós geralmente se importa menos com a proteção de informações publicadas sobre nós? Mark acredita fortemente — e eu concordo com ele — que a resposta para a segunda pergunta é sim, as pessoas estão muito mais dispostas a deixar informações sobre essas fluírem livremente pelo mundo.

Estamos vivendo em um mundo em que todo mundo produz muito mais informações sobre si mesmos e a maioria das pessoas não se sente mais desconfortável em compartilhar parte dessas informações. No entanto, há quem não esteja confortável com isso e ninguém deve forçá-las a fazer o que não gostariam. Eu acho que Zuckerberg mais ou menos concorda com isso também. Muitas de suas ações têm sido interpretadas como se ele estivesse forçando as pessoas a compartilhar dados que elas não querem. E eu acho que ele fez isso algumas vezes, mas, no geral, esse não é o objetivo dele. Ele sabe que tem que levar seus usuários para onde eles estão dispostos a ir. E você também tem que pensar no fato de que ele tem quase 500 milhões de usuários e vai tomar decisões baseado no seu próprio julgamento do que o usuário médio do Facebook quer fazer com suas informações.

Em Nova York, por exemplo, eles decidiram que os usuários do Facebook terão a possibilidade de ter privacidade completa e também terão o poder de deixar todas suas informações invisíveis para outras pessoas, incluindo seu nome e sua foto do perfil. Mas o fato é que se você fizer isso você não pode realmente usar o Facebook. Porque se você não está visível, todo design do software do Facebook é dependente de um terceiro montante de visibilidade de informações sobre eu e você. Então, se meu nome e foto não estiverem lá, você não poderia ter me mandado uma mensagem no Facebook. A funcionalidade do Facebook estaria completamente inútil se eu dissesse “não deixe ninguém ver meu nome e minha foto a não ser que eles já sejam meus amigos”.

Essa mentalidade de privacidade absoluta é predominante na Europa. E eu acho que muitos europeus são estúpidos sobre o que o Facebook realmente é, especialmente no governo, as pessoas na liderança da União Europeia. Muitos líderes governamentais não usam o Facebook e, então, criam demandas estúpidas como se ele fosse um serviço de comunicação qualquer. É uma nova forma de comunicação! Se você não o vê pelo que ele realmente é, você não pode fazer julgamentos inteligentes sobre como eles devem tratar nossos dados. Basicamente, eu acho que o Mark quer que as pessoas compartilhem informações mais livremente; ele acredita que as maioria das pessoas está disposta a compartilhar mais informações sobre eles mesmos e ele sim respeita os indivíduos que escolheram não compartilhar suas informações tão livremente. E foi por isso que na quarta-feira (26), nas mudanças que ele fez, ele basicamente deu novamente aos usuários o controle de tudo que eles vão compartilhar, exceto seu nome e sua fotografia.

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Preocupa a possibilidade de os aplicativos armazenarem nossas informações? Isso é um problema e o Facebook não tem todas as respostas para isso, por que os aplicativos são os aplicativos. Se você usa qualquer aplicativo no Facebook, ou no seu iPhone, ou no Android, ou qualquer aplicativo que use a internet, você está confiando na empresa que fez aquele aplicativo. Do mesmo jeito que quando você usa o Facebook e dá a ele suas informações, você está confiando no Facebook, quando você usa um aplicativo no Facebook, você está confiando na empresa que o fez. E eu acho que a maioria dos usuários do Facebook não pensa muito antes de aceitar a instalação de um aplicativo ao seu perfil. Isso é responsabilidade do usuário. Se você quer usar tudo livremente sem pensar muito, o que é o caso, não há muito do que reclamar.

E, honestamente, talvez você não devesse dar suas informações à Zynga. Eu não tenho certeza de para que a Zynga vai usá-las. Os aplicativos que estão no Facebook pertecem aos usuários também. Cabe a eles saber como essas empresas lidam com seus dados. Talvez o Facebook poderia policiá-los melhor, mas isso é realmente uma coisa entre o indivíduo e o aplicativo. Acho que o usuário tem que assumir alguma responsabilidade por isso.

Essa é a ironia de toda essa controvérsia da privacidade. Facebook é só uma empresa que criou uma plataforma que as pessoas amam. Elas a usam de graça e falam: “Oh, nós não gostamos do jeito que vocês usam a plataforma de vocês”. Bom, vocês podem ir para outra, não? Eu realmente acho que o Facebook deveria ouvir a seus usuários e que os usuários têm o direito de expressar suas opiniões, mas temos de ser realistas: nós estamos usando um serviço grátis com funcionalidades impressionantes e tudo isso é muito novo! Até o Zuckerberg não sabe direito como o Facebook deveria ser usado, a rede social é recente, sabe? Tudo está acontecendo tão rapidamente que não é surpresa que a gente erre como usuários e a empresa erre muito como operadora. Porque, basicamente, ele é um novo meio de comunicação sendo usado por meio bilhão de pessoas praticamente todas as noites. Nós ficamos todos ofendidos porque “oh, eles não estão respeitando nossa privacidade”. Bom, a maioria das pessoas não usava o Facebook um ano atrás e, agora, elas estão dependentes dele. E isso é sua própria escolha.

Com a plataforma Open Graph, que colocou os botões de curtir em vários sites, esse sistema de publicidade direcionada vai ficar mais sofisticada, não? Agora, tudo é gostável. Com certeza, mas ninguém tem de apertar o botão ‘curtir’ se não quiser. O botão “Like” está criando informações sobre os usuários, e quem se sentir desconfortável com isso não deveria clicá-lo.

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E sobre a confiança? Acho que as pessoas gostariam de curtir coisas em vários sites e dar essa informação somente para o Facebook e não para o site que usa o plugin ou para os aplicativos criados por terceiros. Eu já confiei no Facebook entrando nele, porque tenho que confiar em todo o resto? Então, você não deveria clicar no botão de curtir, porque o propósito dele é unicamente social. O “Like” serve para dar mais informações sobre você para seus amigos. Se você clicou, foi porque você queria que os outros soubessem que você gosta daquilo. As pessoas têm de realmente assumir a responsabilidade pelo jeito que eles usam esse serviço, acho que essa é a grande questão. É verdade que o Facebook errou muito ao mudar seu design e sua política de privacidade tão rapidamente. Mas se ele não fizesse isso, outra rede social iria surgir e tomar o seu lugar. Esse é um negócio que não pode ser estático, porque o jeito que todos nós lidamos com o Facebook muda muito velozmente. Seria irresponsável da parte deles.

Então, a questão central é a mudança na forma como nós compartilhamos informações e não é apenas o Facebook? Sim! Nós estamos compartilhando muito mais informações. Por exemplo, eu estou em contato com mil pessoas por dia, que é mais ou menos a quantidade de amigos que eu tenho no Facebook. Há cinco anos, eu estava em contato com provavelmente 15 pessoas por dia! É uma situação totalmente diferente e requer ferramentas diferentes. E não me surpreende muito que as ferramentas precisem mudar rapidamente quando nosso contato diário muda de 15 para mil pessoas por dia. Na coletiva de quarta, o Mark disse que não mudaria as regras de privacidade de novo em pouco tempo. Eu não tenho muita certeza se eu acredito nisso. Talvez ele vá, talvez não.

O Google, em geral, mostra ter menos respeito pelas informações pessoais dos usuários do o Facebook. Ele oferece menos informações sobre como essas informações serão utilizadas e usa o Gmail para direcionar propagandas para você de um jeito muito mais agressivo. Eu não sei a política do Orkut, mas tudo que for perguntado sobre o Facebook deve ser perguntado sobre o Orkut.

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Eu gostaria de saber mais sobre a personalidade de Zuckerberg. Zuckerberg tem um poder muito grande de centralização dentro da empresa. Ele tem a palavra final em qualquer decisão e ninguém o desafia. Quando coloca alguma coisa na cabeça, dificilmente alguém vai dissuadi-lo. Acho Mark bem racional, um visionário. Apesar de ter uma visão clara de para onde quer levar esse serviço e do impacto que isso tem no mundo, ele não liga muito para isso. Mark é um bom rapaz, um pouco tímido, mas não tem medo de expressar suas opiniões quando necessário. E é muito respeitado por seus funcionários: eles o veneram. Na quarta-feira (26), ele corrigiu um erro. Mas não há nenhuma estatística falando que os usuários vão sair do Facebook. Quem estava reclamando era a imprensa, os observatórios de privacidade e o governo. Mark os escutou, percebeu que havia se enganado e corrigiu as coisas. Ele poderia simplesmente não ter feito nada.

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