Abafando os suicídios

Foxconn reúne 20 mil funcionários na China em um comício para 'valorizar a vida'

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Por Agências
Atualização:

Os jovens trabalhadores chineses, que normalmente passam os dias montando iPhones e outros gadgets, ocuparam um estádio nesta quarta-feira, 18, em um campus na China, agitando pompoms e gritando palavras de ordem em um comício para levantar a moral depois de uma sequência de suicídios em fábricas altamente rígidas no país.

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A manifestação dos trabalhadores mostra como a montadora de eletrônicos Foxconn tem sido abalada pelo suicídio de trabalhadores e pela má imagem gerada na imprensa.

“Acredito que o nosso sucesso nos cegou por um tempo muito longo”, disse Louis Woo, assistente especial de Terry Gou, o fundador da Foxconn. “Nós fomos pegos de surpresa.”

 

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A emrpesa tem aumentado salários, contratado consultores e instalado redes de segurança nos prédios para impedir os trabalhadores de pularem das janelas. Outras mudanças incluem rotação de cargos, para que os trabalhadores possam experimentar tarefas variadas, e agrupar pessoas que vêm das mesma província nos dormitórios para que elas não se sintam isoladas.

Porém, Woo afirma que outras mudanças serão adotadas para evitar tais tragédias na força de trabalho, hoje com 920 mil trabalhadores espalhadas por 16 fábricas pela China. Todas elas terão comícios do tipo para levantar a moral dos trabalhadores. Woo diz esperar que a empresa cresça para 1,3 milhão de funcionários em algum momento do próximo ano.

“Não importa quanto tenhamos que nos esforçar, essas coisas vão continuar a acontecer”, disse ele, sobre os suicídios.

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O comício desta quarta-feira aconteceu no gigantesco parque industrial da Foxconn em Shenzen, que emprega 300 mil pessoas e onde ocorreu a maior parte dos suicídios. O último deles — o 12º neste ano — foi no dia 4 deste mês, quando uma mulher de 22 anos se jogou do seu dormitório na fábrica da província de Jiangsu.

Vinte mil trabalhadores, usando fantasias desde animadora de torcida a vestidos vitorianos decorados com bandeiras que diziam “Guarde sua vida como um tesouro, ame sua família”. Os trabalhadores diziam frases semelhantes e os alto-falantes descreviam os planos de carreira deles.

Enquanto caminhavam para o estádio, uma massa de trabalhadores se destinava na outra direção, a da fábrica, para começar o turno da noite. “No passado, do início ao fim da jornada de trabalho, não tínhamos realmente um intervalo. Mas agora estão nos dando um tempo para descansar”, disse o funcionário Huang Jun, de 18 anos. “Se eu puder sair do trabalho cedo o suficiente para me divertir, eu me sentiria melhor e menos estressado.”

 

Outros trabalhadores disseram que gostariam de mais atividades recreativas, como esportes e karaokê.

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Woo disse que é comum os funcionários trabalharem 80 horas a mais em um mês do que a jornada normal, mas a Foxconn está planejando reduzir a quantidade de trabalho e se tornar a primeira empresa da indústria a ter um limite de 36 horas para as horas extras — como define a legislação chinesa.

Foxconn, que faz parte da taiwanesa Hon Hai Precision Industry, se tornou a maior montadora terceirizada de eletrônicos do mundo por entregar produtos de qualidade para marcas como Apple, Sony, Dell, Nokia e HP, com uma margem de lucro muito pequena.

Ativistas por direitos trabalhistas, porém, dizem que o sucesso ocorreu em parte por causa do rígido tratamento com os funcionários, em linhas de montagem extremamente rápidas, e por exigir horas extras demais. A empresa nega tratar seus funcionários de forma desumana.

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Os problemas na Foxconn começaram a aparecer em meio a um crescente movimento por melhores condições de trabalho na China e trouxe à tona a insatisfação dos trabalhadores chineses com seus baixos salários e as altas pressões a que são submetidos — situações que ajudaram a tornar a China no centro de produção do mundo.

Um ativista disse que o comício desta quarta-feira dificilmente vai melhorar as condições nas fábricas e não substitui a necessidade de reformas amplas.

“Eu não acredito que o evento de hoje vá alcançar qualquer mudança além de dar um pouco de teatro (para os trabalhadores)”, disse Geoffrey Crothall, porta-voz do China Labor Bulletin, um grupo de direitos trabalhistas de Hong Kong. “Basicamente o que a Foxconn precisa é tratar os seus funcionários como seres humanos e pagá-los um salário decente. (A solução) não é nenhum quebra-cabeça.”

Jennifer Peltz (ASSOCIATED PRESS)

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