Por que a Apple está indo tão bem?

Apesar de ter registrado um crescimento lento no último trimestre, a Apple já tinha chego ao auge do seu setor

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Por Redação Link
Atualização:

REUTERS

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por Farhad Manjoo, do ‘The New York Times’

Vamos resolver isso de uma vez por todas: apesar do que andam dizendo por aí, o iPhone não está morrendo. E, por extensão, nem a Apple.

É verdade que nos relatórios de faturamento mais recentes, depois de semanas de especulação em Wall Street indicando que as vendas do iPhone teriam finalmente chegado ao auge, a Apple confirmou a notícia: no último trimestre as vendas de iPhones cresceram em ritmo mais lento desde sua criação. Além disso, a empresa projetou um volume de vendas total de US$53 bilhões no trimestre atual, que termina em março, o que representa uma queda de 8,6% em relação ao ano passado e é a primeira queda de faturamento da Apple em mais de uma década.

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Mas se ela finalmente chegou ao auge, é importante lembrar que esse é um dos pontos mais altos já alcançados por qualquer empresa na história. O recente lucro de US$18,4 bilhões é o maior já registrado por uma empresa em um único trimestre.

É preciso começar a discussão com esses dados, porque as pessoas têm a tendência de reagir desmedidamente, de forma quase histérica, a qualquer sugestão de fraqueza por parte da Apple. Assim como picles, coentro e Ted Cruz, a Apple inspira opiniões extremas. Os questionadores estão em alta neste momento. O valor das ações da empresa caiu mais de 11 por cento no ano passado, em um tremendo contraste com as outras quatro gigantes da tecnologia dos EUA.

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Por isso, essa coluna vai tentar fazer uma coisa complicada: entender o que está acontecendo, mas sem entrar na loucura. E depois de conversar com inúmeros observadores que estão próximos à empresa, aqui vai o meu veredito: a Apple vai muito bem, obrigado.

Ela poderia fazer algumas coisas um pouco melhor? Sem dúvida. Algum desses problemas é urgente? Na verdade, não. E com base no que vi, a empresa está trabalhando para resolver suas questões. Ela enfrenta ameaças existenciais? Claro, mas não menos do que qualquer outra gigante da tecnologia. Será que vai continuar a ser uma potência da indústria tecnológica nos próximos anos, gerando lucros em uma escala que nenhuma outra empresa consegue imaginar? É quase certo que sim.

“Não estou preocupado com a Apple em 2015, nem em 2016”, afirmou Ben Thompson, analista do site Stratechery, que questionou o futuro de longo prazo da empresa em um artigo recente. “Estou pensando no arco realizado pela Apple entre 1976 e 2046. A era do iPhone foi o auge de tudo o que ela faz de melhor. Qualquer pessoa que acha que a empresa vai mal neste momento está exagerando. Mas se observarmos em 10, 20 anos, todas as vantagens começam a desaparecer”.

Daqui a pouco vou falar dessas preocupações com o futuro, mas antes vamos começar com o presente. No momento, o maior problema da Apple é seu próprio sucesso. O iPhone completa nove anos de idade este ano. O iPad entra em seu sexto ano de existência. Esses aparelhos a transformaram na empresa mais valiosa do mundo (até que a controladora do Google, a Alphabet, compre a Apple, o que pode acontecer em breve).

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O iPhone se tornou um negócio tão lucrativo que é quase inimaginável – a empresa registra mais faturamento com o iPhone (cerca de US$154 bilhões no último ano fiscal), do que a Amazon, o Facebook, o Google, a Microsoft, a Hewlett-Packard ou a IBM geram com todas as suas operações. Dois terços dos países do mundo tem PIBs anuais menores do que o faturamento anual com as vendas do iPhone.

Ainda assim, a dominância do império móvel da Apple inspira dúvidas sobre o futuro. Quanto mais o iPhone cresce, mais a empresa tem que trabalhar para superar suas marcas anteriores, tornando-a mais vulnerável a alguma nova tecnologia.

A maior crítica em torno do desempenho recente da Apple é a de que a empresa está fazendo coisas demais e, como resultado, a qualidade geral dos produtos começa a cair. Relacionada a isso está a ideia de que ela perdeu parte da magia inovadora e de design, que é sua característica. A empresa lançou um volume maior que o habitual de aparelhos e produtos que não encantaram os críticos. Conforme afirmou a revista Gizmodo em uma manchete que resume o ano de 2015: “Tudo que a Apple lançou este ano foi meia boca”.

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A Apple ainda traz novidades interessantes, mas consigo entender a frustração da Gizmodo. O Apple Watch ainda está em desenvolvimento. O Apple Music e o Apple News são meio bizarros e muito menos interessantes do que aplicativos exclusivos para streaming de música e aplicativos de notícias que existem há muito tempo nas lojas da Apple (como o Spotify e o Flipboard). A Apple TV não oferece nada além do que já existe em outros aparelhos e o controle remoto é incrivelmente pouco amigável. Além disso, o 3D Touch e o Live Photos, as novas características do iPhone, são interessantes, mas não trazem nenhuma novidade.

Contudo, não podemos nos esquecer de que essas críticas são as reclamações de tecnófilos, que não correspondem necessariamente à percepção que os consumidores comuns têm dos produtos da Apple.

“Os críticos são as pessoas que passam boa parte do tempo envolvidas com a análise do mundo da Apple, então são hipersensíveis ao que a empresa faz”, afirmou Horace Dediu, pesquisador do Clayton Christensen Institute e analista da Apple no site Asymco.

A questão básica é a seguinte: no futuro, os aparelhos físicos vão se tornar menos relevantes do que são agora? Se os computadores se converterem em máquinas similares às do filme “Ela” – computadores ambientais etéreos, que existem na nuvem e respondem a nossas vozes e corpos, prevendo nossos desejos – o que vai acontecer com a Apple? Essa é uma empresa cuja existência depende da apreciação cultural do objeto físico. Será que ela seria capaz de prosperar em uma era de computadores ambientais?

Essas são questões bastante interessantes. Tive uma longa conversa com Thompson sobre essas ideias e as aparentes fraquezas da Apple – por que ela não é tão boa quanto o Google nas inteligências artificiais e no reconhecimento de voz; por que ela não conta com a mesma infraestrutura de computação em nuvem que a Amazon; e, principalmente, por que toda a sua cultura corporativa está voltada para a criação de objetos concretos, o que pode limitar sua capacidade de criar serviços on-line acima da média.

Mas, no fim das contas, essa discussão pareceu quase acadêmica. É óbvio que à medida que o mundo tecnológico se transformar, na próxima década a Apple vai precisar se reinventar. Mas o mesmo vale para todas as outras empresas. É isso que se faz nesse setor.

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