?Born Free? e a censura do YouTube

Clipe da cantora M.I.A. provoca polêmica e testa os limites do site de vídeo do Google

PUBLICIDADE

Por Redação Link
Atualização:

Por Guilherme Werneck

PUBLICIDADE

Pedaços de ruivos voaram por todos os lados na última segunda. Alegoria política sobre o estado policial e a repressão a minorias – temas que aparecem de maneira diluída na obra da cantora M.I.A. (Maya Arulpragasam) até agora –, o vídeo de “Born Free”, da cantora anglo-cingalesa, dirigido por Romain Gavras chocou pela violência estilizada e virou o assunto da semana na internet.

O clipe começa com um olhar de jornalista embarcado em uma espécie de tropa de choque norte-americana. A câmera segue policiais numa batida em um prédio onde interrompem a pancadas um casal de meia-idade acima do peso transando, passam por um velho fumando crack, até prender um menino que parece inocente. Fora do prédio, ele é levado a um ônibus onde só há ruivos como ele. Vê-se um grafite de protesto e meninos ruivos, com figurino quase palestino, atirando garrafas nos blindados que levam os presos.

Ao final dos quase 10 minutos, os ruivos são conduzidos a um campo cercado, onde têm de correr da polícia enquanto são caçados e exterminados a tiros e bombas. Com direito a execução sumária de um ruivinho com cara de anjo. Isso tudo com a estética nervosa de Gavras, que abusa de planos subjetivos e câmera lenta, sem medo de ver a denúncia virar propaganda da Benneton.

Foram três as principais reações ao vídeo, discutidas em blogs, jornais e fóruns. A primeira corrente defende a importância dele para expressar o repúdio às políticas norte-americanas contra minorias – Abu Graib, Guantánamo, a tensão racial de Los Angeles, etc. Defendem a eficiência do uso da alegoria.

A segunda de que o vídeo abusou da estética de choque e diluiu tanto o impacto da música, quanto da mensagem principal. Teria se perdido entre metáforas primárias e cenas gratuitas de violência, que mais desviam a atenção do problema principal do que o reforçam. É a visão de que o clipe serve só para vender música. Algo discutível em tempos de derrocada da indústria.

A terceira corrente, de defensores acalorados, é a de que a violência mostrada pela dupla M.I.A./Garvras é de mau gosto, imprópria e inaceitável. Que há limites que não devem ser ultrapassados. E, se forem, não devem estar facilmente acessíveis.

Publicidade

Essa última tese prevaleceu na maior vitrine de vídeos da internet hoje. Colocado no YouYTube, “Born Free” não resistiu mais do que algumas horas no ar. Entrou primeiro como um vídeo qualquer. Foi tirado do ar quase que imediatamente. Colocado de novo, desta vez com restrição de idade, foi tirado de novo.

Isso por que o YouTube tem um sistema de autorregulamentação em que três denúncias são suficientes para tirar um vídeo do ar. À BBC, um porta-voz do Google disse que o site bane “violência gratuita”.

Quem perde é o YouTube. Quem quis acompanhar a história mais polêmica da semana viu o clipe no Vimeo ou no site oficial, o Miauk.com. Até o fechamento desta edição, o vídeo tinha sido visto mais de 2,2 milhões de vezes. Os números não mentem. Dá até para fingir que não está vendo, mas não é fácil apagar um rastilho de pólvora.

Os pedaços do novo clipe de M.I.A. e Romain Gavras

Origem cingalesa M.I.A. é inglesa de pais do Sri Lanka. Seu pai foi guerrilheiro do Exército de Libertação dos Tigres do Tamil Eelam, que luta pela criação de um Estado à parte do país

Contra o império Desde seu primeiro disco, Arular, se posiciona politicamente a favor da união das periferias do mundo contra o “imperialismo” cultural norte-americano. Mas só com “Born Free” deixa isso explícito.

Clipe comprido Com nove minutos, “Born Free” vem na onda de vídeos longos, como “Telephone” de Lady Gaga. Não é coincidência que, semanas antes, M.I.A surgiu na mídia descascando a musa pop

Publicidade

Tal pai, tal filho O diretor do videoclipe, Romain Gavras, é filho do cineasta grego Constantin Costa-Gavras, autor de filmes de forte cunho político como Z (1969), Desaparecidos (1982) e Estado de Sítio (1972)

Garotos em fúria Romain Gavras dirigiu “Stress”, clipe polêmico da dupla de música eletrônica francesa Justice, em que garotos pobres protagonizam um dia de fúria e destruição em Paris

Para chocar Gavras dirige o documentário A Cross the Universe, que mostra bastidores de turnê do Justice nos EUA, fazendo coisas como botar fogo no cabelo de uma menina bêbada

Tudo Sobre
Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.