Provocações em torno dos discursos econômicos de Dilma e Serra

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Por Redação
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Reunidos na inauguração de uma fábrica de implementos agrícolas, em Sorocaba (SP), nesta terça-feira, Dilma Rousseff e José Serra, anteciparam, em seus discursos, fragmentos do debate econômico da campanha presidencial.

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Dilma, obviamente, louvou a política de seu governo, que privilegiou o consumo interno e, para isso, incrementou as transferências de renda e o crédito.

Serra disse considerar falaciosa a tese de que o Brasil deve permanecer exportador de produtos primários e focar na economia de serviços, destacando que, sem o desenvolvimento da indústria, inclusive a exportadora, o País continuará a apresentar altas taxas de subemprego.

À primeira vista, uma visão pode não parecer ter nada com a outra, mas, para bom entendedor, do ponto de vista das políticas macroeconômicas, são caminhos para o desenvolvimento quase opostos, ainda que não excludentes.

É preciso fazer algumas ressalvas antes de prosseguir. Há risco evidente na tentativa de "traduzir" o pensamento econômico dos candidatos, a partir dos ligeiríssimos sinais emitidos em Sorocaba. Para começar, tem-se de apostar que Serra será candidato, o que parece inevitável, mas ainda não foi sacramentado. Depois, é o caso de não esquecer que os programas oficiais de campanha, formulados pelos partidos aliados, terão pouca aderência aos programas reais de governo. E, no fim das contas, resta a possibilidade de que, tanto Serra quanto Dilma peçam, caso cheguem lá, que se esqueça o que disseram e escreveram, como tem sido comum entre os políticos brasileiros.

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Mesmo assim, talvez não seja um exercício inteiramente inútil avançar numa primeira interpretação dos "programas econômicos" dos candidatos. Nem que seja para provocar a imaginação dos leitores... Então, lá vai:

Ao mencionar "indústria" e "exportação de manufaturados", como forma de combater o subemprego, Serra reafirma seu DNA desenvolvimentista clássico. Diferentemente do que possam defender seus aliados, o "programa" de Serra, se obedecesse a essa ideia, deveria contemplar um mix de políticas em que haveria ênfase num câmbio mais desvalorizado e em políticas industriais ativas, foco em infra-estrutura logística (estradas, portos, aeroportos), tendência protecionista, com acordos de comércio bilaterais, e redução da carga tributária nas exportações. Se quiserem rotular, o "programa", em essência, configuraria um intervencionismo mitigado.

Herdeira do pensamento econômico pragmático de Lula, Dilma "sugeriu", em Sorocaba, a formulação de um "programa" de intervenção estatal mais abrangente, na garantia de melhoria da infra-estrutura básica (energia, telecomunicações etc.). Esta teria de ser capaz de suportar a pressão produzida pela expansão do mercado interno, que, com o aprofundamento das políticas de renda (transferências, inclusive previdência, salário mínimo), continuaria avançando. Dilma exerceria menos pressão sobre as políticas monetária e fiscal, e impulsionaria, com incentivos ao setor de insumos, a produção de commodities metálicas e alimentares. Um "programa" intervencionista, com ênfase no gasto social. 

É curioso, mas não uma novidade, que, quando se faz um exercício de interpretação como esse, aflorem sinais aparentemente trocados. Exemplos: o industrialismo abraçado por Serra é um ponto tradicional de apoiadores de Dilma; e o elogio do movimento do País na direção de uma economia de serviços, com grande protagonismo no mercado internacional de commodities, costuma ser discurso de aliados de Serra.

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