STF não deve julgar mérito do Ficha Limpa antes das eleições

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Por João Bosco Rabello
Atualização:

Roriz durante visita ao Ceasa no Setor de Industria e Abastecimento em Brasilia. Foto: André Dusek/AE - 19/08/2010

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Em relação à constitucionalidade do projeto Ficha Limpa só há um consenso no Supremo Tribunal Federal, depositário final dos recursos daqueles vetados pelo Tribunal Superior Eleitoral: o julgamento de mérito dificilmente ocorrerá antes das eleições.

O que não torna menos importantes decisões do TSE como a que deve confirmar daqui a algumas horas a inelegibilidade de Joaquim Roriz. Mas projeta o cenário de eleitos sub judice, que baseiam seus recursos na presunção da inocência até o já famoso "transitado em julgado", entre outros aspectos legais.

Mas o famoso em questão virou peça de ficção, o que produziu um vácuo de impunidade por onde entrou o projeto popular que hoje divide o mundo jurídico. Nesse universo também há um só consenso: o erro original é do Congresso Nacional, que não teria cumprido seu papel legislador, aperfeiçoando a proposta.

Já em campanha eleitoral, os parlamentares escolheram o caminho que lhes pareceu mais conveniente, de condicionar a inelegibilidade a condenações por colegiados, deixando para o Judiciário os aspectos constitucionais do projeto.

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Que inclui, além da presunção de inocência até condenação definitiva, a proibição de punição retroativa e o princípio da anterioridade, pela qual mudanças de natureza eleitoral e tributária só entram em vigor um ano após aprovadas.

O TSE, instância máxima da justiça eleitoral, interpretou que a inelegibilidade é uma condição do condenado em segundo grau, não uma punição e acha que encontrou aí um caminho para contornar o questionamento em relação à presunção de inocência.

Com o voto contrário de Marco Aurélio Mello, que resume o pensamento dos juízes críticos do projeto: a inelegibilidade é, em si, uma punição, por suprimir um direito de quem ainda não está condenado em definitivo.

Esse é o ponto central dos recursos dos vetados pelo TSE que recorrem ao STF. E encontra guarida em uma provável maioria de cinco entre os nove que atualmente dão quórum para as votações (Joaquim Barbosa está de licença médica e a vaga de Eros Grau, aposentado recentemente, não será preenchida antes das eleições).

O assunto não é novo nos dois ambientes do Judiciário. Durante o regime militar, uma regra similar à da Ficha Limpa foi rejeitada pelo TSE, por 4 a 3, com o voto pela sua inconstitucionalidade dos ministros Leitão de Abreu e Xavier de Albuquerque, este o relator.

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É verdade que a regra era muito mais drástica e ditatorial, pois previa a inelegibilidade pela simples denúncia contra um potencial candidato. Mas a leitura dos votos dos ministros da época deixa claro que eles examinaram estritamente o aspecto constitucional, tendo por eixo a presunção de inocência pela falta de condenação definitiva do vetado.

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Mesmo sendo de interesse dos militares, a Lei foi considerada inconstitucional com o voto contra de Leitão de Abreu, um alicerce jurídico do regime. Mas foi reformada pelo STF, que reverteu o placar a favor da lei, por 5 votos a 4.

Esse mesmo placar agora pode se repetir, a favor ou contra a Lei, pelas posições já conhecidas dos ministros que julgarão o mérito. As incógnitas são a ministra Ellen Gracie e o presidente da Casa, César Peluso. Este, porém, tem biografia constitucionalista, o que o torna, teoricamente, crítico da aplicação da regra na forma e tempo em que ocorrem.

O mais grave, porém, é que o tema criou um clima passional também no Supremo. Circula informalmente a notícia de que os que são pela aplicação imediata da Lei podem pedir vistas em atitude protelatória se sentirem ameaça de derrota na votação do mérito. Manteriam assim, à falta de julgamento, a vigência da decisão do TSE.

Teríamos, então, aquilo que simbolizaria o colapso do sistema: o juiz, de quem se espera que julgue, utilizando o recurso advocatício da protelação, com o qual justifica a criticada morosidade do Judiciário.

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