A investida do Palácio sobre o bloco rebelde, ainda que pudesse ser classificada de plenamente exitosa, não pôs fim à instabilidade na base de sustentação e não atingiu o PMDB.
Os próprios líderes petistas têm se referido ao resultado da ação do Palácio sobre o bloco como uma desidratação, o que confirma o êxito apenas parcial na empreitada. Não seria, portanto, suficiente para enfrentar a votação do Marco Civil ainda.
E não configura exagero admitir a possibilidade de que o projeto acabe não sendo votado este ano. Além do teste político que passou a representar, com risco específico para o governo, a discussão de mérito não está pacificada como chegou a circular.
A oposição ao ponto mais polêmico, a neutralidade da rede, não está removida, conforme relatos de parlamentares do PMDB reunidos ontem para avaliar o atual estágio das relações com o governo.
Após a reunião, o líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), apesar de admitir um avanço nas negociações, advertiu que as alterações acertadas não são suficientes para garantir a aprovação da matéria.
A supressão de trechos como o que restringe à presidente da República, por decreto, a regulamentação da neutralidade, é uma filigrana diante da própria neutralidade - questão que divide os partidos e parlamentares.
A iniciativa de ministros de pôr em votação a matéria ainda produziu o efeito colateral de irritar a Câmara, gerando clima de mal estar mesmo entre os petistas. A pauta de votações é instrumento exclusivo da presidência da Casa.
Para piorar o quadro em desfavor do governo, o escândalo da compra da refinaria de Pasadena, pela Petrobrás, em operação suspeita, ocupou a pauta dos debates e se impôs como fato político maior.
A admissão pela presidente Dilma Rousseff, ao Estadão, de que dera parecer favorável à operação quando presidente do Conselho da Petrobrás, aumentou a temperatura política e ofuscou completamente a discussão sobre o Marco Civil.
O desenvolvimento desse enredo, independentemente do resultado do Marco Civil, mostra que há danos irreversíveis na relação do Planalto com oLegislativo. Mesmo no Senado, onde tem contornado derrotas previsíveis, o governo está desgastado.
O governo amplia o clima de desconfiança com adiamento ou manobras para descumprir acordos ou desfazer atos do Congresso. Exemplo disso são as emendas bloqueadas sob o pretexto de avaliação técnica, que revoga, na prática, o orçamento impositivo aprovado recentemente no Legislativo.
O meio político absorveu por esse viés, de saturação das relações com a presidente Dilma Rousseff, a afirmação do candidato de oposição, Eduardo Campos, de que "o país não aguenta mais quatro anos de Dilma".
A frase tem um apelo grande junto aos políticos e empresários, que apontam a personalização do governo na figura da presidente, a causa dos conflitos com os mercados político e empresarial.
Campos foi ao ponto mais sensível a todos os agentes do processo político e econômico que passaram a projetar por mais quatro anos todas as dificuldades que sentem hoje em relação ao diálogo com a presidente.