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Crônicas sobre política municipal. Cultura brasileira local sob olhar provocativo | Colaboradores: Eder Brito, Camila Tuchlinski, Marcos Silveira e Patricia Tavares.

Miss Licitação e a lei do diabo

Por Eder Brito

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Por Redação
Atualização:

Se for necessário escolher uma palavra que faz parte do vocabulário obrigatório e diário do poder público certamente teremos o termo Licitação como um dos mais proferidos por servidores e agentes políticos. E não é por acaso. Todas as compras e aquisições feitas por governos precisam passar necessariamente por este processo. Uma definição mais acadêmica diria que licitação é todo o procedimento administrativo integrado por atos e fatos da administração pública e dos licitantes para fins de contratação de obras, serviços, publicidades, compras, alienações e locações. Mas esta definição é muito longa e chata. É melhor entender como sendo o processo que torna... lícitos e transparentes os gastos do governo. Ou pelo menos deveria.

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A lei que rege as licitações na administração pública brasileira é a 8666/93. O número sempre é alvo de chacota. O 666 final sempre vira uma analogia com a referência demoníaca numérica. E esta piada está para a administração pública como o "é pavê ou é pa comê", repetida por 9 entre 10 tios engraçadões, está para as festas e confraternizações em família.

Dia desses, sala de aula lotada de funcionários públicos municipais em uma escola de gestão pública. O curso de capacitação do dia tratava justamente de licitações. O professor se esforçava para explicar as diferentes modalidades do processo. Falou das concorrências, leilões, tomadas de preços, convites, pregão... Quando explicava a modalidade concurso, um braço se levantou. "Professor, tenho uma dúvida!". A pergunta vinha de um procurador, titular de demandas jurídicas pouco agradáveis (existem as muito agradáveis?) em um município com pouco mais de dez mil habitantes. "Em minha cidade nós fazemos todo ano um concurso de Miss, com premiação em dinheiro. Como é que eu faço para licitar este tipo de serviço?".

A pergunta, que foi feita de forma séria, tem fundamento. É tradicional que festas temáticas e festas de aniversário de pequenos municípios sempre incluam concursos de miss. E na maioria das vezes a premiação das belas moçoilas vem dos cofres públicos. Pela lei, concurso é a modalidade de licitação para escolha de trabalho técnico, científico ou artístico, mediante a instituição de prêmios ou remuneração aos vencedores. Nada mais justo que um procurador faça a pergunta, portanto, já que, inclusive em seu município, o dinheiro que vai para a sorridente Miss vencedora sai dos bolsos do contribuinte.

O procurador não se fez de rogado e continuou: "Como é que eu vou licitar em modalidade concurso algo que não é trabalho técnico, trabalho científico e nem trabalho artístico?". Perspicaz, o professor em sala não teve dúvida: neste caso, é trabalho genético.

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A piada é boa, mas o alerta é sério. A 8666 não atende mais à várias demandas reais do dia-a-dia dos municípios. É um dos "ralos" que prejudica o administrador público bem intencionado e favorece muita coisa errada. Lei do diabo.

 

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