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Woo Suk Hwang quer clonar cães e vacas no Brasil

ENTREVISTA EXCLUSIVA: Cientista sul-coreano, protagonista de um dos casos mais escandalosos de fraude na ciência, quer fechar parcerias para produzir clones no Brasil, para fins comerciais e de pesquisa biomédica e biotecnológica

Por Herton Escobar
Atualização:

FOTO: Hwang na redação do Estado. Crédito: Marcio Fernandjes/Estadão  Foto: Estadão

Herton Escobar / O Estado de S. Paulo

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Woo Suk Hwang, o cientista sul-coreano que protagonizou um dos maiores escândalos de fraude na história da ciência moderna, quer desenvolver pesquisas no Brasil, ligadas às áreas de biomedicina, cosméticos e biotecnologia animal - incluindo a clonagem de cachorros e bovinos.

"O Brasil tem um potencial enorme na área de biotecnologia. Estamos conversando com possíveis colaboradores interessados, incluindo cientistas e empresários", disse Hwang ao Estado ontem, com exclusividade, durante uma rápida passagem pelo País. Segundo ele, foi sua primeira entrevista concedida a um jornalista estrangeiro (de fora da Coreia) em vários anos. "Os detalhes eu só poderei revelar num futuro próximo", completou, com um sorriso no rosto.

Dez anos atrás, em fevereiro de 2004, Hwang também tinha motivos de sobra para sorrir, graças à publicação de um trabalho pioneiro na revista Science, que relatava a primeira obtenção de células-tronco embrionárias humanas clonadas de uma pessoa adulta - um feito histórico, que trazia com ele a expectativa de cura para uma série de doenças. No ano seguinte, mais motivos para sorrir, com a publicação do primeiro clone canino (um cachorro chamado Snuppy) e de um segundo trabalho que relatava a obtenção de outras 11 linhagens de células-tronco embrionárias humanas, clonadas de pacientes com diabetes e outros problemas de saúde. Estava aberta, supostamente, a era da "clonagem terapêutica".

No final de 2005, porém, a felicidade desapareceu do rosto de Hwang, quando denúncias e investigações revelaram que os dois trabalhos com células-tronco eram uma fraude completa. Hwang caiu em desgraça científica e foi expulso da Universidade Nacional de Seul, mas continuou a ser adorado pelo público na Coreia e se reergueu da cinzas. Recebeu US$ 3,5 milhões em doações e, já em 2006, criou um novo centro de pesquisas biotecnológicas, o Sooam Biotech, que tem como maior destaque (e fonte de recursos) a clonagem comercial de cachorros. Mais de 600 "adoráveis dog pets" clonados já foram produzidos em seus laboratórios, segundo ele. O centro também produz animais transgênicos e trabalha com clonagem de vacas, porcos e cães para fins de pesquisa e possíveis aplicações terapêuticas.

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Assim, Hwang voltou a sorrir. Mas garante que não está satisfeito. "Quero uma nova chance", diz ele, em tom melancólico, para provar que a ciência por trás de suas pesquisas com células-tronco embrionárias era verdadeira.

A seguir, alguns destaques da entrevista, divididos em tópicos:

Sobre células-tronco e fraude Quando pergunto a Hwang qual é sua "missão" hoje como cientista, ele olha para cima, franze a testa e pensa por vários segundos antes de responder. "Quero produzir minha segunda, e terceira, linhagem de células-tronco embrionárias humanas, usando minha própria tecnologia. E quero ter uma chance de usar essas células para curar doenças incuráveis no futuro. Esse é meu desejo maior e final como cientista", diz ele.

Hwang reconhece que ambos os trabalhos tinham dados e imagens adulteradas e fabricadas, e mereceram ser retratados. O segundo, que descrevia as 11 linhagens, foi uma "fabricação total", diz ele, atribuindo a culpa a um coautor "de outro hospital". Já a linhagem do primeiro trabalho, segundo ele, era verdadeira. "Acredito fortemente que a primeira linhagem que produzimos (publicada em 2004) era verdadeira. Concordo que havia problemas nos dados e nas imagens, mas acredito que a natureza das células estava correta, que eram realmente células-tronco humanas embrionárias e clonadas", afirma Hwang.

Após o escândalo, ele diz que parou voluntariamente de fazer pesquisas com células-tronco embrionárias humanas - entre outros motivos, porque o governo sul-coreano parou de aprovar seus projetos e lhe dar dinheiro para isso. Mas gostaria muito de retomá-las. E espera que as pessoas voltem a confiar nele como cientista.

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"Quero muito continuar minhas pesquisas com células-tronco embrionárias humanas, se a sociedade coreana entender e concordar com isso. Se o governo coreano me der autorização para retomar essas pesquisas, garanto que farei isso com um postura muito mais humilde", diz ele. "Passei por momentos muito difíceis, muitas dificuldades nos últimos dez anos. Mas essas dificuldades fizeram de mim um cientista mais forte e uma pessoa mais humilde."

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Sobre clonagem de cachorros A principal atividade da Sooam Biotech é clonar cachorros. Alguns deles são produzidos com alterações genéticas, para servir como modelos animais para o estudo de doenças - por exemplos, beagles geneticamente modificados (transgênicos) para desenvolver Alzheimer. A maioria, porém, são cães de estimação ou dotados de habilidades especiais, como cães farejadores de alta performance utilizados pela polícia coreana. O serviço custa cerca de US$ 100 mil, segundo esta reportagem da revista Naturehttp://migre.me/jdBhH

Pergunto a Hwang se clonar cães é ciência ou negócio: "Quando clonamos o primeiro cão, Snuppy, em 2005, a taxa de sucesso da clonagem era inferior de 1%. Hoje, passamos de 35%; então posso dizer que a clonagem de cachorros deixou de ser ciência e passou para a escala industrial", responde ele. Porcos e vacas são mais difíceis de clonar, com taxas de sucesso de 15% e 10%, respectivamente, por conta de características biológicas e reprodutivas de cada espécie.

Sobre a clonagem de um mamute O projeto mais audacioso - e midiático - do centro no momento é a clonagem de um mamute congelado encontrado na Sibéria. Hwang diz que foi chamado para participar do projeto por causa de sua experiência com a clonagem de uma espécie ameaçada de coiote, utilizando uma técnica de "clonagem interespecífica", que usa um animal de espécie diferente (porém geneticamente próxima) da que se deseja clonar como doadora de óvulos e barriga de aluguel.

No caso do coiote, foram usados os óvulos e o útero de uma cadela. No caso do mamute congelado, a ideia é usar uma fêmea de elefante asiático - que, segundo Hwang, o governo de Mianmar já concordou em fornecer.

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O primeiro passo para o processo, segundo ele, foi dado recentemente, com a extração de células intactas ("em estágio muito inicial de desenvolvimento") do tecido muscular do animal congelado. O próximo passo será colocar o núcleo dessa célula dentro do óvulo de um elefante e fazer com que ela vire um embrião. "Espero dar início a esses experimentos no ano que vem", diz Hwang. "Mas é apenas uma expectativa."

Se ser certo, quem sabe, Hwang será o primeiro cientista a trazer uma espécie extinta da pré-história de volta a vida. Ele certamente gostaria disso.

FOTO: Hwang com a equipe que participou da clonagem do cachorro Snuppy (em seu colo), em 2005. Crédito: Reuters/You Sung-Ho  Foto: Estadão

Sobre biotecnologia no Brasil "Também quero usar minhas tecnologias de clonagem para abrir uma nova era de pesquisa na indústria biomédica, especialmente aqui no Brasil. Há um potencial enorme para isso aqui nos setores de bovinos e suínos. Um dia o Brasil será o líder mundial no uso da tecnologia de clonagem animal nas indústrias de biomedicina e biotecnologia", diz Hwang.

Ele não revela os nomes dos cientistas ou empresas com quem está conversando, mas diz que está negociando parcerias para trazer suas tecnologias para o Brasil. No setor de suínos, a Sooam Biotech produz porquinhos transgênicos para servirem como modelos de pesquisa de doenças (por exemplo, diabéticos) e, possivelmente, como doadores de órgãos para seres humanos (numa estratégia conhecida como xenotransplantes, baseada no fato de que porcos e pessoas possuem órgãos bastante semelhantes). No setor de bovinos, o centro desenvolve vacas transgênicas capazes de produzir moléculas de interesse farmacológico no leite.

Sobre cosméticos Dois meses atrás, Hwang lançou ainda mais um negócio: uma linha de cosméticos chamada DraCell, cujos ingredientes ativos, segundo ele, são derivados do meio de cultura de células-tronco (o líquido no qual as células são cultivadas em laboratório). Considerando a aparentemente inabalável fama de Hwang na Coreia do Sul, o fato do produto funcionar ou não deverá ter pouco impacto no seu sucesso comercial.

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Para mais notícias sobre células-tronco, incluindo um outro escândalo recente no Japão, clique aqui: http://migre.me/jdBlY

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