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Uma dica cultural de um amigo meu

Por Estadão
Atualização:

Meu amigo Luiz Antonio me ligou para dar uma dica cultural para o fim de semana. Perguntei: 'por que você não me manda um e-mail para eu ver o que é?' Ele fez melhor: se ofereceu para escrever um texto. Como sei que ele tem ótimo gosto e ainda escreve super bem, compartilho aqui com você.

Grande Luiz! Nos vemos na peça. Qual é o melhor dia?

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Abs, F.

Cabaré da Rrrraça: Spike Lee teria invejaLuiz Antonio

A discussão sobre 'arte engajada' só acontece em um tipo de situacão: quando o objeto artístico é fraco e só o que sustenta sua existência é um discurso. Aí, sim, críticos aparecem aos montes dizendo que a arte deve ser livre, que não precisa passar mensagens e todas essas outras coisas a que estamos acostumados. Quando alguém observa a Guernica, de Pablo Picasso, não usa esses argumentos. Quando lê 'As Vinhas da Ira', de Steinbeck, também não. Quando ouve 'Strange Fruit' na voz de Bilie Holiday muito menos. E o mesmo acontece quando alguém assiste a uma peça do Bando de Teatro Olodum.

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Em primeiro lugar, temos que lembrar que estamos falando de teatro. O teatro é o lugar para as pessoas pensarem. Mais que o cinema, muito mais que a televisão. Nos palcos, os questionamentos surgem de todas as formas. A política está lá, os relacionamentos, as ideologias. A grande maioria dos textos teatrais tratam de assuntos polêmicos de forma incisiva, cortante. E a questão do negro no Brasil é um desses temas tabus que o teatro deve tratar.

O Bando de Teatro Olodum é uma das principais companhias teatrais brasileiras. Como está fora do eixo Rio-São Paulo, não é tão badalada por aqui. É um grupo talentosíssimo, formado por uma equipe de dar inveja a quaquer companhia teatral. Já montaram mais de 20 peças, entre elas uma versão maravilhosa de 'Sonho de uma noite de verão', de Shakespeare, que ganhou o Prêmio Braskem em 2006. O Bando nasceu do Grupo Cultural Olodum em 1990, tendo à frente os mais que competentes diretores Marcio Meirelles e Chica Carelli. Os atores e atrizes são espetaculares. Atores, com A maiúsculo- não modelinhos para enfeitar a novelinha juvenil. São todos negros e isso não é um detalhe. A música dos espetáculos é sempre forte e bem colocada. E as coreografias estão a cargo de ninguém menos do que Zebrinha, um dos maiores bailarinos e coreógrafos do nosso país (só para o leitor ter uma ideia, Zebrinha lecionou danças na Stadeliyk Conservatoriam en dans Academie te Arnhem, na Academie Internationale de Paris na França, no Project Studio em Munich e na Federatie Friy Tiyed na Bélgica e dividiu o palco com os maiores dançarinos do mundo).

Essa turma, ou melhor, esse Bando estará em São Paulo, no SESC Vila Mariana a partir deste final de semana. Oportunidade rara para ver seus espetáculos na terra da garôa.

A programação começa com Cabaré da Rrrrraça. Espetáculo inteligente e bem-humorado que trata a questão do negro no Brasil como poucas vezes se viu. Todos os estereótipos, todas as situações constrangedoras, está tudo lá. A peça tem cenas hilárias e faz pensar, dando porrada em todo mundo. Se Spike Lee vivesse nossa realidade e entendesse português, ia morrer de inveja. Ah, você acha que não existe racismo no Brasil? Garanto: você é quem mais deve ir.

Na próxima semana, tem 'Ó paí, ó', o sucesso "comercial" do Bando. Virou filme, série de televisão. Divertido, sem perder a crítica social, vale a pena nem que seja para você ver a 'peça que deu origem à série'. Nas telas, 'Ó paí, ó' conta com Lázaro Ramos, um dos maiores atores brasileiros da atualidade. Ator que surgiu adivinhem onde? No Bando de Teatro Olodum.

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Junto com 'Ó paí, ó', temos uma surpresa a mais. Será um final de semana especial, com a linda peça Áfricas. Uma simples peça infantil? As coreografias, o figurino, as músicas, os atores. A direção segura. Não, não é uma 'pecinha' infantil, não. Essa viagem pelo nosso passado, pela nossa herança africana e pelos vários países, reinos e diferenças culturais existentes na África é para crianças e adultos de todas as cores. O Brasil esconde até hoje nossa herança negra e nossos heróis negros. Aqui em São Paulo temos a Avenida Rebouças, a Rua Teodoro Sampaio- e ninguém sabe que eles eram negros. O negro só pode ser destaque nos locais 'reservados' a ele: no carnaval, no samba, no futebol, na capoeira. O Teatro Experimental do Negro e Abdias do Nascimento tentaram mudar isso na década de 40 (mas você também provavelmente nunca ouviu falar deles). O Bando de Teatro Olodum está aqui em São Paulo e é hora de você conhecê-los. Mas espere um segundo. De acordo com o raciocínio do meu primeiro parágrafo, nada disso que escrevi aqui valeria seu ingresso se as peças fossem fracas. E eu garanto: elas são absolutamente fantásticas. Vai lá, negão.

Bando do Teatro Olodum no SESC VILA MARIANA Rua Pelotas, 141. Ingressos à venda em todas as unidades do SESC. 'Cabaré da Rrrraça': dias 9, 10 e 11 de abril 'Ó paí, ó': 16, 17 e 18 de abril 'Áfricas': 17 e 18 de abril

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