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Conselheiro do Tribunal de Contas do Município de São Paulo defende instalação de Procuradoria

Maurício Faria afirma que ausência de Ministério Público de Contas na corte concentra poder político nos conselheiros

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Por Mateus Coutinho
Atualização:

por Fernando Gallo

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O conselheiro do Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCM-SP) Maurício Faria afirma que o tribunal resiste à implantação da Procuradoria de Contas, embora esteja prevista pela Constituição Federal, e diz que, sem ela, o poder se concentra nos conselheiros, escolhidos por agentes políticos.

O TCM-SP é o único tribunal de contas do País a não contar com um Ministério Público de Contas.

Maurício Faria diz ser favorável ao pedido de que o Ministério Público de Contas (MPC) do Estado, feito em dezembro pela Associação Nacional do Ministério Público de Contas (AMPCON), atue na capital enquanto o TCM não instala uma procuradoria de contas municipal.

ESTADO: O TCM 'resiste abusivamente' a instalar a Procuradoria, como diz a Associação Nacional do Ministério Público de Contas? Por quê?

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CONSELHEIRO MAURÍCIO FARIA: O Procurador Geral de Justiça do Estado de São Paulo, chefe do Ministério Público Estadual, propôs ação judicial contra o TCM-SP por este resistir à implantação do modelo organizacional obrigatório determinado pela Constituição Federal, a partir do paradigma constitucional dado pela estrutura do TCU, e que prevê duas carreiras especiais, preenchidas por concursos públicos específicos: a do Ministério Público de Contas e a de Conselheiro Substituto (Ministro Substituto no TCU), com a garantia, também, de um membro de cada carreira ocupar dois dos cargos de Conselheiros (Ministros no TCU). A ação judicial teve decisão provisória em sentido contrário, por parte do TJ-SP, e aguarda o julgamento final de recurso extraordinário pelo Supremo Tribunal Federal. Nesses termos, a Associação Nacional do Ministério Público de Contas, que defende nacionalmente os membros dos Ministérios Públicos de Contas, e apoia essa ação judicial, entende que o TCM-SP resiste abusivamente à aplicação do modelo constitucional.

ESTADO: O pedido administrativo da associação, feito no TCM, para que o Ministério Público de Contas estadual atue no tribunal é "totalmente ilegal", como alega a presidência do TCM?

MAURÍCIO FARIA: A  tese da associação, ao que consta, é a de que se o TCM-SP se opõe à existência dentro dele de um Ministério Público de Contas com o argumento jurídico de que só existe Ministério Público em âmbito federal e estadual e não no nível municipal, então, para que ocorra a necessária atividade de fiscal da lei nos processos do TCM-SP, esta poderia, temporariamente, ser exercida pelos membros do Ministério Público de Contas do TCE-SP, atendendo, se não propriamente à forma, pelo menos ao conteúdo da disposição constitucional.

A tese jurídica da maioria dos Conselheiros do TCM-SP, surpreendentemente aceita na decisão provisória do TJ-SP, é a de que não cabe o Ministério Público de Contas em um Tribunal de Contas Municipal, porque não existe Ministério Público Municipal e sim somente o MP Estadual. Trata-se de um artifício argumentativo, pois o Ministério Público de Contas distingue-se totalmente do Ministério Público Federal e Estadual, sendo uma carreira interna do Tribunal de Contas, cujas decisões têm caráter administrativo, e não judicial. O Ministério Público Federal e Estadual, por sua vez, é uma outra instituição, autônoma, com competências várias, ligadas à atuação do Poder Judiciário. A lógica do modelo constitucional é a de que a estrutura de todo e qualquer Tribunal de Contas deve conter as duas carreiras e os dois Conselheiros delas originários, por aquela sistemática de pesos-e-contrapesos, equilibrando vertentes técnicas e políticas. Aliás, o Tribunal de Contas do Município do Rio de Janeiro já tem as duas carreiras, sem qualquer questionamento jurídico, e também estará abrangido pela decisão do STF, que deverá uniformizar, em um ou outro sentido, a estrutura organizacional dos dois tribunais municipais.

 ESTADO: Há motivação política na decisão do TCM de não instalar a Procuradoria de Contas? Qual?

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MAURÍCIO FARIA: A principal crítica aos Tribunais de Contas é a de que, por condicionantes e acomodações políticas, eles não têm total independência e autonomia frente aos Executivos, Legislativos e Judiciário, que, entretanto, devem fiscalizar, e de que suas decisões são excessivamente influenciadas por critérios políticos, em detrimento de critérios técnicos. A presença das duas carreiras preenchidas por concursos públicos especiais, e de dos dois Conselheiros oriundos delas, fortalece uma vertente técnica para interagir, nos processos e julgamentos, com a outra vertente de origem político-partidária, qualificando e otimizando o desempenho dos Tribunais de Contas.

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 ESTADO: Qual a importância da criação das carreiras de procurador e auditor?

MAURÍCIO FARIA: As duas carreiras técnicas determinadas constitucionalmente - Conselheiros Substitutos e Procuradores de Contas -, e o dois Conselheiros vindos delas, visam produzir aquele efeito de pesos-e-contrapesos previsto no modelo constitucional formulado historicamente pelos fundadores da democracia  norte-americana, contrabalançando a vertente político-partidária de indicação livre e aprovação dos outros Conselheiros, realizada pelos agentes políticos (Executivo e Legislativo). As duas carreiras contam com garantias constitucionais para seus membros, que, no âmbito dessa independência funcional, gozam de total autonomia e não estão sujeitos a restrições de atuação por parte do Presidente e demais Conselheiros do Tribunal. A presença das duas carreiras e dos dois Conselheiros vindos delas, inclusive, altera o sistema de poder dentro dos Tribunais de Contas. Assim, a resistência à implantação das duas carreiras significa suprimir esse mecanismo controlador, de pesos-e-contrapesos, e concentra o poder interno nos Conselheiros escolhidos livremente pelos agentes políticos. Nesse sentido, há, indubitavelmente, uma questão de poder político interno.

ESTADO:  Por que o sr. considera ser voz isolada no TCM em relação a este tema?

MAURÍCIO FARIA: No TCM-SP, uma maioria de Conselheiros vem se opondo à criação das duas carreiras e dos cargos oriundos delas, defendidas favoravelmente pela Associação dos Membros dos Tribunais de Contas (Atricon) e pela Associação Nacional do Ministério Público de Contas. É o único Tribunal de Contas no Brasil que não segue o modelo constitucional. Assim, quem está isolado é o TCM-SP. O próprio TCM-RJ tem as carreiras. E o TCE-SP, cumprindo decisões judiciais,já criou as duas carreiras e já tem uma Conselheira proveniente de cargo de Conselheiro Substituto.

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ESTADO: Qual a jurisprudência do STF em relação ao tema?

MAURÍCIO FARIA: A jurisprudência do STF tem sido uniforme no sentido de fazer valer o modelo constitucional obrigatório, o que prevaleceu, inclusive, na sua decisão obrigando o TCE-SP a instituir as duas carreiras e promover integrantes de cada uma delas para os dois respectivos cargos de Conselheiros, bem como reconhecendo a organização do TCM-RJ. Caberá, agora, ao STF julgar esse argumento originalíssimo da maioria dos Conselheiros do TCM-SP, que, aliás, só questiona a carreira do Ministério Público de Contas, mas não a de Conselheiros Substitutos, a qual, então, deveria, por coerência, ter a sua criação providenciada imediatamente.

ESTADO: O que pode ser feito, de imediato, para que essas carreiras sejam criadas no TCM?

MAURÍCIO FARIA: Entendo que os meios de comunicação deveriam informar mais amplamente sobre as questões do TCM-SP no atual processo de preenchimento de uma vaga de Conselheiro neste Tribunal, apontando os aspectos negativos e positivos de atuação desta instituição, suas potencialidades e o perfil do Conselheiro que o momento atual dele requer.

 

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