PUBLICIDADE

Foto do(a) blog

Impressões sobre a vida e seus arredores

O escritor abana o rabo

Vejam como ele faz tudo para se mostrar faceiro.

Por Raul Drewnick
Atualização:

Escrever é triste. Escrever é sempre um pedido de atenção, de aplauso, de socorro. Tão fácil ver isso. Olhem para nós, dizemos, e, mesmo que só um leitor olhe, queremos conquistá-lo. Abanamos a cauda, miamos aflitamente, ensaiamos graciosas corridinhas. Usamos o melhor de nosso repertório, desencavamos advérbios astutos, adjetivos traiçoeiramente açucarados. O leitor há de cair na armadilha. Apregoamos nosso produto como aqueles vendedores que se agarram a nós assim que colocamos o primeiro pé para dentro da loja. Dizemos que nosso texto tem brilhos que na verdade só existem na nossa imaginação e recorremos ao abjeto truque de sugerir que amanhã talvez não haja mais nenhum texto nosso à disposição da freguesia. Talvez nem nós estejamos mais aqui, porque nem todos somos imortais. E tossimos tosses de tísico, e falamos de preocupantes ultrassonografias. Queremos ser amados, ainda que seja por aquele leitor único diante do qual assobiaríamos a protofonia do Guarani, se isso melhorasse nossa cotação. Escrever é fazer o leitor anotar nosso telefone, mesmo sabendo que ele jogará o papel ali adiante. Escrever é plantar a esperança de que o celular toque de madrugada e uma voz tímida, desculpando-se por ligar em hora inadequada, pergunte: estou falando com o escritor? Escrever é sonhar que em nosso velório apareça um tipo muito distinto, desconhecido de parentes e amigos, que chorará sobriamente e, depois de nos comparar a Vinicius e a Drummond, se retirará debaixo dos murmúrios de todos: "É o leitor!"

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.