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Psiquiatria e sociedade

Opinião|Perseguição a Dilma Rousseff

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Atualização:

Nessa terça-feira, dia 18 de setembro, Edimeire Celestino da Silva foi notícia mais uma vez. Há uma semana ela já estivera nas manchetes após uma tentativa um tanto aparvalhada de invadir o Palácio do Planalto e declarar seu amor pela presidente Dilma Rousseff. A segurança presidencial notou sua presença nas cercanias do Palácio da Alvorada, residência oficial da presidente, e acionou a polícia militar. Abordada, ela disse que só sairia dali depois de pedir Dilma em casamento, mas acabou dissuadida de insistir. Ao menos por ora.

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O caso de Edimeire não é isolado, e remete a um fenômeno conhecido pelo termo inglês stalking, algo entre o assédio e a perseguição. Atores, cantores e políticos, dados sua proeminência e visibilidade, são especialmente vulneráveis a essa situação - no Canadá, por exemplo, estudos mostram que quase um terço dos políticos já foi vítima de algum tipo de perseguidor.

Como na maioria dos casos de stalking a celebridades, Edimeire sofre de um transtorno mental. Segundo sua mãe, assim que Dilma Rousseff saiu candidata a filha se apaixonou, cobrindo o quarto com fotos e pôsteres, mas só veio a se tratar justamente após uma crise envolvendo sua paixão. Em 2010 ela foi detida degolando pombos no centro de Campinas, onde mora. Segundo ela, essa era uma forma que encontrara de chamar a atenção de Dilma, num raciocínio tortuoso que lembra o de John Hinckley Jr., que em 1981 tentou assassinar o presidente americano Ronald Reagan para atrair a atenção da atriz Jodie Foster, por quem se apaixonara desde que vira o filme Taxi Driver. Assim como Edimeire, ele apresentava um transtorno mental. E embora alegadamente ela esteja em tratamento, por seu comportamento e suas declarações é difícil imaginar que ela esteja bem. Ao dizer ser homem, marido da presidente, tentando forçar sua entrada no Palácio do Planalto a despeito dos guardas, Edimeire dá sinais de que sua capacidade de ajuizar a realidade está, no mínimo, comprometida.

Sabe-se que entre 80 e 90% dos casos de assédio a famosos são perpetrados por pessoas com algum diagnóstico psiquiátrico, sobretudo os transtornos psicóticos, nos quais o paciente pode perder o contato com a realidade se não tratado de forma apropriada. Temas de paixão e hostilidade são os mais comuns, e o padrão é exatamente o oposto do encontrado em perseguidores a não famosos - nesses casos, na maioria das vezes trata-se de alguém que não aceita uma rejeição amorosa e passa a perseguir o objeto de seu desejo, mas só 20% das vezes o assediador tem algum diagnóstico psiquiátrico.

Nunca é demais lembrar que a maioria dos atos violentos no mundo é cometida por pessoas sem qualquer transtorno mental, e que os pacientes psiquiátricos não são mais perigosos do que qualquer pessoa - de forma geral eles envolvem-se até em menos agressões, na verdade. O caso de Edimeire vem reforçar que, no caso de pacientes psiquiátricos, a maior violência é permitir que eles fiquem sem tratamento adequado.

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Susan J. Adamsa, Tracey E. Hazelwoodb, Nancy L. Pitrec, Terry E. Bedardd, & Suzette D. Landrye (2009). Harassment of Members of Parliament and the Legislative Assemblies in Canada by individuals believed to be mentally disordered Journal of Forensic Psychiatry & Psychology, 20 (6) DOI: 10.1080/14789940903174063

Opinião por Daniel Martins de Barros

Professor colaborador do Dep. de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP. Autor do livro 'Rir é Preciso'

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