Foto do(a) blog

A campanha eleitoral na internet e nos tribunais

A superfície e o subsolo das eleições

Entre os espaços de disputa eleitoral, o judiciário joga papel ambivalente ("quase" paradoxal). Em nome do equilíbrio da disputa, exerce função onipotente no ciclo eleitoral: ele legisla, administra, fiscaliza e julga as eleições.

PUBLICIDADE

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

Por Daniel Vargas*

PUBLICIDADE

A disputa eleitoral corre em dois "mundos" paralelos.O primeiro mundo é a superfície eleitoral: aqui ocorre o dia-a-dia das campanhas e a tentativa de conquistar o apoio dos eleitores.  O segundo é o subsolo eleitoral: neste mundo, ocorre a captação de recursos para viabilizar a participação eleitoral e ratificar os resultados da disputa.

Na superfície eleitoral, a estratégia de ação dos candidatos e partidos inclui envolver as pessoas, pregar com ideais e propostas, participar de debates, diferenciar-se dos adversários.As ações que ocorrem na superfície eleitoral são regidas, em grande parte, pelo direito eleitoral e controladas de perto pelo judiciário, pela imprensa e pela sociedade civil.

Por trás da superfície, está o subsolo eleitoral; um segundo mundo, mais extenso e complexo, e às vezes mais sombrio.No subsolo, acontecem todas as ações de (i) captação de doações, (ii) o jogo de apoios da mídia, e (iii) a mobilização (às vezes paga) de militantes.

No subsolo, o objetivo principal é maximizar cada um dos três recursos eleitorais básicos: dinheiro, informação, apoio.A estratégia varia em cada caso, e requer táticas e rotinas específicas.Muito do que acontece no subsolo ocorre à margem das leis, ou é, em princípio, considerado ato legal.Normalmente avançam sem grande escrutínio, abaixo da linha do radar da sociedade civil.

Publicidade

No fim das contas, o vencedor final do processo eleitoral, na maior parte dos casos, vence a disputa nos dois mundos: na superfície e no subsolo.Nas urnas: obtém mais votos.No subsolo: capta mais dinheiro, mídia, militância e "direitos".

Em alguns casos (cada vez menos frequentes), o vencedor das urnas perde a disputa por algum dos recursos no subsolo eleitoral, mas consegue dar a volta por cima e levar nas urnas.

Em outros (cada vez mais frequentes), quem toma posse no governo perdeu nos votos, mas ganhou no subsolo eleitoral--especialmente na justiça.Apenas no estado do Amazonas, por exemplo, em torno de 10% dos prefeitos foram cassados no último ciclo eleitoral e com frequência o segundo colocado assumiu.

A mídia e a sociedade tendem a concentrar sua atenção na "campanha eleitoral".Ao longo do tempo, vamos nos dando conta de como, na verdade, o período de campanha é uma erupção momentânea de uma série de ações no subsolo que começaram muito antes da publicidade na TV, e que prosseguirão além da apuração dos votos--com a análise e arremate dos tribunais.

Sem compreender o processo eleitoral em seus dois mundos, e sem prestar atenção na dinâmica entre a superfície e o subsolo eleitoral, é impossível compreender, com clareza, o real funcionamento das eleições, os seus defeitos mais marcantes e o melhor caminho para resolvê-los.

Publicidade

*Daniel Vargas é professor e coordenador do Centro de Justiça e Sociedade da FGV Direito Rio

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.