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Os Hermanos

Kirchners querem impor sua melodia à imprensa

Kirchners querem mídia dançando de acordo com sua música

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Por arielpalacios
Atualização:

A Câmara de Deputados da Argentina aprovou na madrugada desta quinta-feira a polêmica "Lei de Radiodifusão", que pretende substituir a lei antiga, que data dos tempos da última Ditadura Militar (1976-83).

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Os debates, que foram intensos, começaram às 11:30 horas, atravessaram o dia e concluíram às 1:15 horas da madrugada desta quinta-feira. Dezenas de deputados da oposição haviam deixado horas antes o plenário, alegando que a sessão havia sido confirmada de forma 'irregular'.

O governo obteve 146 votos a favor. Três deputados votaram contra. Outros três parlamentares abstiveram-se. Além deles, 104 deputados opositores estiveram ausentes, já que horas antes haviam deixado o plenário, como modalidade de protesto contra irregularidades na convocação da sessão.

O governo da presidente Cristina Kirchner alega que a nova lei é imprescindível para acabar com os "monopólios" de comunicação existentes na Argentina e gerar mais "pluralidade" na mídia do país. Além disso, sustenta que a nova lei favorecerá a produção nacional de conteúdos.

A lei tem um objetivo claro, que é o de torpedear o Grupo Clarín, que foi aliado do governo entre 2003 e 2008 e com o qual está em estado de confronto desde abril do ano passado (segundo a presidente Cristina e seu marido e ex-presidente Néstor Kirchner, o "Clarín" está por trás de um 'golpe de Estado' contra o casal presidencial).

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A oposição retruca e afirma que a nova lei implica nas maiores "restrições" à liberdade de imprensa aplicadas à mídia argentina desde o fim da Ditadura. Além disso, alega que a nova lei favorecerá o surgimento "novos monopólios", cujos donos seriam amigos empresários do casal Kirchner.

Na terça-feira no fim da noite a comissão parlamentar de comunicação, mesmo sem quórum, definiu a votação da Lei de Radiodifusão para esta quarta-feira. A oposição reclamou, já que o procedimento era explícitamente irregular. O governo ficou em silêncio e procedeu com a convocação da sessão. O governo introduziu 215 modificações de última hora no projeto.

Mas, a sessão da comissão só teve seis horas de duração, consideradas insuficientes - por parte da oposição - para avaliar todas as modificações. De quebra, só nas últimas três horas da reunião o governo distribuiu cópias das modificações aos integrantes da oposição. O governo tem pressa em aprovar a lei, enquanto consegue manter relativa coesão entre seus aliados.

A oposição afirma que o governo - que está há seis anos no poder - só pensou em alterar a Lei de Radiodifusão após a briga com o Grupo Clarín.

Uma empresa do setor de mídia não pode ter um canal de TV aberta e ao mesmo tempo um canal de TV a cabo dentro da mesma área geográfica. Desta forma, o Grupo Clarín terá que definir o que faz: se fica com o canal Trece, seu canal de TV aberta, ou se fica com o Todo Notícias, seu canal de notícias por TV a cabo.

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O grupo de mídia de Francisco de Narváez, que é dono do jornal El Cronista, terá o mesmo dilema: fica com o canal de TV aberta América 2 ou o América Notícias, de TV a cabo?

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O projeto de lei indica que cada empresa não poderá englobar 35% da população do país (Buenos Aires e a Grande Buenos Aires concentram quase 35% da população). Isto é, um empresário que tenha um canal de TV aberta em Buenos Aires não poderá ter também um canal de TV a cabo. Poderá ter nas províncias de Córdoba, Jujuy ou outras. Mas não em Buenos Aires e arredores.

Isto quer dizer que vai aumentar o número de postos de trabalho, já que surgirão dezenas de pequenas empresas de mídia em todo o país? Digamos que em alguma área do país uma empresa venda seu canal de TV a cabo. Quem compre aquela empresa, vai instalar uma nova estrutura? Ou manterá a mesma estrutura? Ou demitirá os trabalhadores e reduzirá os postos de trabalho?

Além disso, os pequenos canais independentes teriam que depender - em um contexto de crise econômica como o atual - dos subsídios do governo em publicidade oficial.

Os analistas também indicam que a nova lei permitirá "mais pluralidade". No entanto, também destacam que criará "maior fragmentação" das empresas de mídia, já que estas estarão limitadas em sua abrangência geográfica.

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Mas, enquanto nenhuma empresa privada (pequena, média ou grande) poderá ter um canal de TV a cabo e ao mesmo tempo um canal de TV aberta em todo o país, o Estado argentino desfrutará desse privilégio.

Desta forma, será o único canal verdadeiramente nacional do país. Aliás, o Estado argentino já conta com o Canal 7 (a TV Pública), e também tem o canal Encuentro, na TV a cabo. E poderá ter mais canais.

Isso também aplicar-se às estações de rádio: desta forma, acabariam redes como Cadena 3, Radio Continental, La Red ou Mitre. Isto é, se alguém na rádio Continental fizer uma denúncia contra o governo em Buenos Aires, esse programa não poderá ser ouvido, digamos, em Ushuaia, Mendoza ou Misiones.

Outro aspecto polêmico da lei é que cada operador de TV a cabo somente poderá ter um canal dentro do leque de canais que seu serviço oferecerá.

Outro problema para as empresas atuais: a partir da entrada em vigência desta lei, as empresas de mídia só terão um ano para vender a companhia da qual pretendem se desprender.

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Os críticos do projeto sustentam que nesse prazo, com os Kirchners ainda no poder, aparecerão empresários amigos do casal presidencial para comprar, como em um supermercado, diversos canais em todo o país, que - por causa dos curtos prazos e da crise econômica - serão vendidos a preços baixos.

Isso ocorrerá, convenientemente para o governo, um ano antes das eleições presidenciais.

O projeto de lei determina que as licenças para canais de TV poderão durar 10 anos e ser renovadas por outros 10.

Mas, a cada dois anos as licenças terão que passar por revisões. Isto é, ocorrerão duas revisões a cada mandato presidencial.

Mais ainda: há um artigo, que está mal redigido, que indica que o Poder Executivo poderá negar a licença de um canal de TV a um jornal ou revista. De forma categórica.

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As revisões das licenças serão feitas pelo Poder Executivo. O normal, em outros lugares, é que o Parlamento esteja presente nessas análises. Ou o Parlamento sozinho ou o Poder Executivo e o Parlamento juntos. Mas, nunca o Poder Executivo sozinho. Haverá uma comissão que englobará o governo, o parlamento e ONGs, mas que de todas formas, terá maioria do governo, especialmente se for um governo peronista.

Esta peculiar comissão, que analisará e concederá as concessões, terá este formato:

Sete representantes. Destes, a) dois serão nomeados pela Presidência da República. b) três serão do Congresso Nacional c) e os restantes dois serão indicado pelo 'Conselho Federal'.

Bom, dissecando cada caso, temos este cenário. - Dois membros nomeados pela Presidência da República. Isto é, favoráveis ao governo de plantão.

- Três virão do Congresso. Aqui está a armadilha: dos três membros, um será correspondente à primeira minoria (isto é, o governo), outro à segunda minoria (que eventualmente pode ser de um partido afim ao governo ou 'comprável', como os peronistas dissidentes) e um da terceira minoria (este, sim, com certeza será da oposição real).

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- Dois do "Conselho Federal de Comunicação Audiovisual", organismo no qual os governadores da província terão muito peso. Atualmente, a maioria dos governadores são aliados do governo (embora o número esteja em queda). Desde os anos 40, a maioria dos governadores argentinos sempre foi peronista. Um desses dois membros da sociedade civil será do setor universitário. Seria, possivelmente, de uma universidade pública, onde o governo possui grande influência na designação de cargos. E o outro membro será designado diretamente pelo Conselho Federal, no qual os governadores peronistas são maioria.

Desta forma, a) em um cenário bem positivo para o governo de plantão, se for peronista, teria até seis dos sete membros da comissão. b) ...e em um cenário, digamos, 'ruim', o governo contaria com quatro representates do total de sete. Assim, sempre teria maioria.

O governo não aceitou elaborar o projeto de lei em conjunto com setores da oposição. Mas, aceitou muitas colaborações de ONGs ignotas, tais como a Agrupación Comandante Andrecito, cuja sede está em uma chácara.

A lei do governo abre espaço para vários tipos de grupos de comunicação: - Licenças estará destinado a ONGs (estas terão um terço do total das licenças) - Setor privado - Setor público, onde entram universidades (mas só as públicas), o Estado argentino e a Igreja Católica.

Uma das peculiaridades do projeto é que só a Igreja Católica terá privilégios (outros cultos não serão contemplados por esse benefício), pois o governo dos Kirchners consideram que é uma entidade pública pré-existente ao próprio Estado argentino. Isto é, existia antes da independência nacional. É estranha esta questão, pois a Igreja Católica tem péssima relação com os Kirchners. Mas, os analistas destacam que por trás desta concessão de grande espaço na mídia à Igreja está a intenção do governo Kirchner de amainar as críticas que a cúria fez nos últimos anos ao casal presidencial. Um dos sinais da eficácia dessa manobra ficou clara nas últimas semanas, quando a Igreja optou por não fazer referências ao projeto de lei do governo. Vale a pena recordar que somente 10% dos católicos argentinos são praticantes...

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O projeto de lei deixa de lado a regulamentação sobre a publicidade oficial. E além disso, é obscuro sobre empresas que participam de licitações estatais, que poderiam ser também donas de meios de comunicação.

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