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Diálogo intercontinental sobre futebol, com toques de política, economia e cultura.

Algo há com Leo Messi

Carles: Enquanto a crônica especializada espanhola insiste em que Messi arrasta problemas físicos ou de outro tipo e por isso não consegue o rendimento habitual, desde sua Argentina natal chegam outras versões, muito mais frias e calculistas. O fato é que Lionel, em pouco tempo de carreira, já conseguiu ganhar quase tudo no Barça, individual e coletivamente. Se falta alguma coisa para ele, é o pleno reconhecimento vestindo a 'albiceleste'. Segundo os conterrâneos de "La Pulga", esta temporada ele vai estar sem estar, porque o seu principal objetivo seria reservar forças para comandar sua seleção e ganhar o título mundial de seleções no dia 13 de julho do ano que vem, no Maracanã. Com qual versão você fica?

Por Carles Martí (Espanha) e José Eduardo Carvalho (Brasil)
Atualização:

Edu: Fico com a posição dos hermanos, ele está visivelmente preocupado em se poupar, ou para usar o termo preferido de vocês, 'dosificar'. O artigo do jornalista argentino Rodolfo Chisleancho publicado nesta semana pelo El País, sob o sugestivo título 'Olvídense de Messi', é mais do que esclarecedor. Não sei se será algo muito acintoso por parte de Messi, mas tem toda a lógica do mundo ele ter um ano meia-boca e chegar tinindo para o Mundial que o colocará definitivamente no patamar de Maradona. Mas essa decisão pressupõe alguns perigos para Messi e para o Barça, incluindo seus companheiros de time.

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Carles: Tem também uma entrevista do 'jefecito' Mascherano à revista argentina 'El Gráfico' ratificando essa versão. Não parece um deslize, mas um depoimento com o intenção definida de acalmar a torcida dos vossos vizinhos. Se for o caso do Messi se proteger e de ser protegido, esta é a temporada ideal, com um Barça 'argentinizado' até os ossos, com a cobertura garantida pela presença de um compatriota no comando, sobretudo porque Tata Martino está empenhado em dosar os esforços não só de Messi, como do resto dos jogadores. Poderia ser um álibi perfeito para prestar um inestimável serviço à pátria em busca de um segundo 'maracanazo'. Uma decisão kamikaze dessas só se justifica no caso de o treinador confiar plenamente nas possibilidades de um Barça sem o melhor Messi e revezando seus principais valores, para chegar a, pelo menos, três quartos da temporada. Para dizer a verdade, até chegarem os Bayerns, os Chelseas, etc, até dá, colocando o Messi só para cumprir seu compromisso com o público.

Edu: Mas aí entra o Barça na história e não acredito que a ortodoxa coletividade 'culé' vai ser condescendente com esse arranjo com jeitão de milonga. Tudo tem limite mesmo em se tratando de Messi. Mais de 60% do time a Espanha que vem à Copa é também do Barça e eu diria que uns 50% do time brasileiro, personificado em Neymar e Dani (este, uns 5%). Todos precisariam de uma atenção semelhante, mas como ficam? Merecem ou não a tal da dosificação? Além do que, no primeiro resultado atravessado, vamos imaginar uma derrota contundente para o Madrid no segundo turno ou um escorregão na Champions, até mesmo a 'Pulga' será inevitavelmente questionado, como o Barça já fez com tantos craques que passaram por aí. Nessas horas, ninguém pensa em Copa do Mundo, Seleção e essas coisas.

Carles: Neymar acabou de chegar. Chegou e emplacou mas não tem o mesmo saldo positivo do argentino. O fato é que, se Messi estiver mesmo se reservando para a disputa da Copa, ele e seus assessores devem ter calculado todos esses riscos. Uma hora ou outra, o rendimento do time vai cair, alguns resultados não vão ser os esperados e, nesse momento, chegam as urgências por encontrar culpados. E isso é assim com qualquer massa torcedora. Então, certamente ninguém vai lembrar do Alex Song. E mais se detectarem um esforço menor do ídolo. Outra possibilidade é que a campanha seja justamente para manter vivo o entusiasmo da torcida argentina até a Copa, diante da garantia da presença da seleção no torneio e da evidência de que  Messi não consegue manter o seu habitual nível de jogo.

Edu: De qualquer jeito, Messi é uma prova viva de que o fato de ser bom moço e craque ao mesmo tempo não é suficiente no futebol. Sua personalidade fechada, seu carisma limitadíssimo quanto às luzes midiáticas e os pontuais ataques de estrelismo que, pelo que vocês dizem, ele já teve no vestiário fazem do melhor do mundo um tipo no mínimo esquisito, também diante de seus colegas. E não acho que um comportamento desses colabore para melhorar a integração plena de Messi ao Barcelonismo ou para as outras feras do Barça. Quando abril chegar e as competições estiverem no pico da intensidade, como estará o jogador mais determinante dos últimos anos? De uma coisa eu sei: se Neymar ao menos sugerisse se poupar, seria crucificado em plena Ramblas e pendurado na estátua de Colombo.

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Carles: Olha Zé, disso eu entendo. Mesmo tendo chegado com pouco mais de 12 anos (ou principalmente por isso), Messi é um emigrante, dividido em seus valores afetivos. Ele tem demasiadas referências de Rosário, do bairro dele, para virar um catalão de uma hora para outra. Até se casou com a namoradinha de lá. Só que a questão é que 'el pibe' ganha a vida em Barcelona e não como um trabalhador qualquer, mas como um dos cidadãos mais eméritos da cidade, da província, do país. Não tem como não parecer esquisito quando se vive num contínuo conflito de identidades. Bom, para alguns é mais fácil do que para outros e, no caso de um cara introspectivo como Messi, não deve ser lá muito fácil. Quanto ao Neymar, eu daria tempo ao tempo. A impressão que eu tenho é que todos os brasileiros, menos o próprio Neymar, estão esperando a punhalada ou a crucificação, talvez com algo de razão, devido a casos passados. Mas torço e tenho a certeza de que Neymar não é Ronaldinho, nem Rivaldo, nem o Fenômeno. Inclusive, teve a oportunidade de aprender com a passagem de todos eles por aqui.

Edu: Então será o momento de pagar para ver, porque há dois cenários possíveis: ou Messi vai mesmo se dofisicar, estar e não estar como você diz, e segurar o rojão se o pior acontecer; ou o Barcelonismo pode jantar seu maior ídolo no caso de uma queda precoce na Champions ou perda do título da Liga para o Madrid. Porque não vejo compreensão possível por parte da torcida ou da direção ou da Catalunha inteira só porque é ano de Copa e Leo Messi que estar entre algodões para chegar fervendo ao Brasil vestido de azul e branco.

Carles: Pode ter certeza, torcida e compreensão não cabem na mesma frase.

 

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